Treinadores e Jogadores. Who made who?

“Temos de defender melhor” Nelo Vingada.

A forma é óbvia. O conteúdo inexistente. Defender melhor, sim. Mas, como? No momento de defender, todo o Vitória de Guimarães era desnorte e mau posicionamento no relvado. Muitas marcações individuais, expõem em demasia a equipa, face à movimentação inteligente do adversário (para “romper” numa equipa que defende ao homem, basta ter mobilidade no ataque). São os avançados que determinam o posicionamento dos defesas, pelo que lhes é possível aclarar espaços, em zonas frontais à baliza, para que os médios / extremos / defesas possam aparecer.

“A pressão deve exercer-se sobre a bola, não sobre o jogador” Cruyff (2002).

“Quem marca ao homem corre por onde o rival quer. Essa caçada tem por fim capturar um inimigo, mas o meio usado converte o marcador em prisioneiro” Valdano (2002).

Custa a aceitar que um dos treinadores responsáveis pela versão portuguesa dos princípios do jogo, não tenha tido capacidade para os implementar na sua totalidade (uma equipa que defende com base nas marcações individuais, só se mostra capaz de cumprir o princípio da concentração (proximidade entre jogadores), de forma aleatória, e somente quando o adversário é o suficientemente atabalhoado, para que tal aconteça).

Como explicar? Nelo Vingada não acredita nos seus conhecimentos, e não os tentou implementar? Não foi capaz de transmitir e operacionalizar o que pretendia? Ou perante o hábito daquela que tem sido a vivência dos jogadores do Vitória, estes não se mostraram disponíveis para a mudança? Fica a dúvida. Somente Vingada poderá responder.

Como forma de transmissão e operacionalização das suas ideias, José Mourinho recorre a um processo denominado como “descoberta guiada”, garantindo a implementação das mesmas, e a satisfação dos seus atletas, pela forma activa, como participam no processo.

“Jogadores com este nível não aceitam o que lhes é dito apenas pela autoridade de quem o diz. É preciso provar-lhes que estamos certos. A velha história do mister ter sempre razão não é aqui aplicável. (…) O trabalho táctico que promovo não é um trabalho em que de um lado está o emissor e do outro o receptor. Eu chamo-lhe a descoberta guiada, ou seja, eles descobrem segundo as minhas pistas. Construo situações de treino para os levar por um determinado caminho. Eles começam a sentir isso, falamos, discutimos e chegamos a conclusões. Mas para tal, é preciso que os futebolistas que treinamos tenham opiniões próprias. Muitas vezes parava o treino e perguntava-lhes o que eles sentiam em determinado momento. Respondiam-me, por exemplo, que sentiam o defesa direito muito longe do defesa central. Ok, vamos então aproximar os dois defesas e ver como funciona. E experimentávamos, uma, duas, três vezes, até lhes voltar a perguntar como se sentiam. Era assim até todos, em conjunto, chegarmos a uma conclusão. É a esta metodologia que chamo a descoberta guiada”.

O sucesso / insucesso (não o ocasional) de uma equipa não pode nunca ser dissociado da dinâmica que se estabelece entre treinadores e jogadores. Para além da competência, a disponibilidade de ambos para a mudança (depois de em situação de exercício / jogo, comprovadas as vantagens da mesma) tem de ser total. A atitude ditatorial de alguns treinadores, incapazes de modelar as suas ideiais iniciais, não percebendo que as mesmas, independentemente da sua qualidade ou não, poderão não se aplicar em determinado contexto, e a indiponibilidade, por parte dos jogadores, para interpretar o jogo de forma diferente, é um dos maiores entraves (para além da ausência de conhecimentos e /ou incapacidade para os operacionalizar) ao desenvolvimento de um jogar colectivo.

P.S. – Post ao Santana, Simão, Berhan, Noronha, Botelho, António Almeida, Godinho, Mouro, Proença, Ramos, Coti, Pedro Santos, Rui, João Silva, Gonçalo, Luís, Saraiva e ao Malaquias.

Sobre Paolo Maldini 3828 artigos
Pedro Bouças - Licenciado em Educação Física e Desporto, Criador do "Lateral Esquerdo", tendo sido como Treinador Principal, Campeão Nacional Português (2x), vencedor da Taça de Portugal (2x), e da Supertaça de Futebol Feminino, bem como participado em 2 edições da Liga dos Campeões em três anos de futebol feminino. Treinador vencedor do Galardão de Mérito José Maria Pedroto - Treinador do ano para a ANTF (Associação Nacional de Treinadores de Futebol), e nomeado para as Quinas de Ouro (Prémio da Federação Portuguesa de Futebol), como melhor Treinador português no Futebol Feminino. Experiência como Professor de Futebol no Estádio Universitário de Lisboa, palestrante em diversas Universidades de Desporto, Cursos de Treinador e entidades creditadas pelo Instituto Português do Desporto e Juventude (IPDJ). Autor do livro "Construir uma Equipa Campeã", e Co-autor do livro "O Efeito Lage", ambos da Editora PrimeBooks Analista de futebol no Canal 11 e no Jornal Record.

3 Comentários

  1. Este processo do Mourinho é evidentemente o melhor, porque torna os jogadores parte da solução, capazes de discutir opçoes e até de corrigir sozinhos aspectos do jogo durante os 90 minutos. As equipas tornam-se nitidamente mais fortes quando os seus jogadores sabem decidir colectivamente as suas acções. Mas… quantos treinadores sabem deixar as suas ideias serem discutidas? Isto não é fácil de implementar, nem com crianças.
    O caso do JJ no Benfica é um pouco o contrário do que o Mourinho diz. Apesar do sucesso, ele tem a postura de quem sabe de bola a rodos e explica aos jogadores porque é que as suas opções são as melhores. Funciona muito bem enquanto se ganha. Na eventualidade de perder 3 jogos seguidos, já não vai a tempo para se abrir ao dialogo sem que isso seja percebido como uma fraqueza, uma incapacidade. Este tipo de pedagogia tem de começar desde o primeiro dia e (aspecto importante) funciona muito melhor no Inter ou no Barça do que no Leixões ou até no Sporting. Precisa de uma equipa experiente, madura, que já tenha conhecido uma mão cheia de treinadores, muitos sucessos e insucessos, para saber expressar o que é uma boa opção.
    Bom artigo, obrigado.

  2. Boas!

    Depois de ver este comentário tinha de me intrometer.

    Acho que nem é necessário chegar aos seniores para se sentir essa diferença.

    Nem que seja em termos de motivação, entrega e interesse no treino, e respeito por regras, faz muito mais sentido o caminho da descoberta guiada.

    Quando os jogadores ( e dirigentes, e pais e tudo o que é malta envolvente, se possivel ) entende o porquê das coisas, fica muito mais facil de todos puxarem pelo mesmo lado.

    Seja no defender a zona e não ao homem, seja no cumprir do regulamento interno, seja naquelas pequenas tarefas de quem é que arruma o material.

    Acabamos por estar assim a discutir estilos/tipos de liderança.

    É muito mais poderoso quando nos seguem porque nos compreendem, porque acham que é mesmo essa a solução, do que se nos seguem porque sim, porque quem manda é o treinador.

    Acho que um pouco do que o Gadelfitz estava a dizer é isto mesmo, quando se referia a possibilidade das relações se quebrarem quando houver resultados menos bons.

    Quanto ao post, faz-me confusão que ainda haja "malta" que seja renitente e não olhe para este caminho como aquele que faz mais sentido.

    Abraço!

  3. sinceramente não faço a minima ideia do que dizer sobre este tema. Nao estou minimamente ligado ao mundo do futebol e portanto nao sei como é que funciona a mente dos jogadores. Não entendo, porém, como é que um treinador experiente e com boas ideias do jogo não consegue fazer passa-las para o jogador. O exemplo cronico que temos, o Mourinho, além de um estratega brilhante consegue fazer passar as suas ideias para os jogadores e daí saber retirar o melhor que eles tem. Ir falar com Cristiano e dizer-lhe que tem procurar melhores soluções para a bola não deve ser tarefa para qualquer um…muito menos para alem que fale um bom português.

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