Jorge Jesus, Garay e os passes verticais

white corner field line on artificial green grass of soccer field
“É muito forte. Tem um passe vertical muito interessante”. Jorge Jesus sobre Garay.
Jorge Jesus pode ter imensos defeitos enquanto treinador. Porém, não perceber de futebol, seguramente que não é algo que se deva apontar ao treinador português.
Se do seu discurso procurar retirar o conteúdo, esquecendo a forma, certamente que terá muito a aprender. Muito pertinente a forma como destacou a importância que Garay previsivelmente terá no modelo de jogo encarnado. Particularmente nos momentos ofensivos. Até porque, na partida com o Toulouse, a incapacidade para sair para o ataque com qualidade e bola no relvado, bem visível na primeira parte muito se deveu à forma, por vezes atabalhoada como Fábio Faria procurava solicitar os colegas à sua frente, ou como os restantes colegas de sector (Javi, André e Emerson) não demonstraram capacidade para fazer a bola progredir, que não de forma lateralizada.
A grande vantagem de um passe vertical a “queimar” sectores, é precisamente as situações que proporciona a quem recebe a bola. Uma bola que entre directamente dos defesas centrais, num apoio frontal de Saviola ou Cardozo, retira da situação de jogo mais de metade da equipa adversária. Rapidamente de uma situação de 11×11, poderá passar-se para uma de 4 (Alas e avançados do Benfica)x 4, eventualmente 5, dependo da dinâmica que o treinador adversário pretenda dar ao seu médio defensivo e da interpretação que este fará da situação de jogo.
Com bola no corredor central, o seu portador tem inúmeras opções, seja à direita, à esquerda, ou até à frente, dependendo da situação de jogo, seja no explorar da possível profundidade, conferida por movimentos de rupturas dos alas, ou até na procura do pé de um dos colegas (alas ou avançado sem bola) para tabelar. Num corredor lateral, para além de bem longe da baliza a imprevisibilidade da acção do portador da bola é nula. Dali, a bola terá de seguir necessariamente na direcção do meio. É que para o outro lado, termina o campo.
Recorde, a título de exemplo, que a incessante lateralização ofensiva do seu jogo, foi sempre a causa maior de tão pouca imprevisibilidade do futebol do Sporting de Paulo Sérgio.
De Garay importa referir que pela sua classe e imponência no jogo aéreo, tem tudo para marcar uma era no SL Benfica. Previsivelmente, voltará o Benfica a ter um central capaz de ser importante na saída de bola, tal como David Luiz havia sido. Com uma vantagem nesse campo, porém. A saída em passe, será bastante mais segura que a feita em progressão com a bola. É que um passe vertical mal direccionado, não deixará o seu autor ultrapassado e fora da situação de jogo. Uma perda de bola, sim.
P.S. – Na movimentação colectiva, talvez deva Jorge Jesus considerar a hipótese de se estar a expor demasiado ao risco. Em situação defensiva, envolver demasiados jogadores na primeira linha de pressão, poderá trazer dissabores se o adversário for o suficientemente qualificado para ultrapassar a tal linha com a bola dominada no pé, e não em futebol directo, onde já se sabe, Javi, Luisão e Garay serão capazes de na primeira bola devolve-la ao meio campo adversário, enquanto os colegas recuperam. Em situação ofensiva, é de louvar a colocação de tanta gente em zonas de finalização. Todavia, e confirmando-se que não há elementos que pela sua velocidade e disponibilidade recuperem rapidamente metros no campo de jogo para assegurar uma boa transição defensiva, talvez não seja má ideia não envolver tanta gente nas imediações da grande área contrária.
Texto previamente publicado aqui.
Sobre Paolo Maldini 3828 artigos
Pedro Bouças - Licenciado em Educação Física e Desporto, Criador do "Lateral Esquerdo", tendo sido como Treinador Principal, Campeão Nacional Português (2x), vencedor da Taça de Portugal (2x), e da Supertaça de Futebol Feminino, bem como participado em 2 edições da Liga dos Campeões em três anos de futebol feminino. Treinador vencedor do Galardão de Mérito José Maria Pedroto - Treinador do ano para a ANTF (Associação Nacional de Treinadores de Futebol), e nomeado para as Quinas de Ouro (Prémio da Federação Portuguesa de Futebol), como melhor Treinador português no Futebol Feminino. Experiência como Professor de Futebol no Estádio Universitário de Lisboa, palestrante em diversas Universidades de Desporto, Cursos de Treinador e entidades creditadas pelo Instituto Português do Desporto e Juventude (IPDJ). Autor do livro "Construir uma Equipa Campeã", e Co-autor do livro "O Efeito Lage", ambos da Editora PrimeBooks Analista de futebol no Canal 11 e no Jornal Record.

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