Da formação. Do ganhar e do perder. E Draxler, a estrela em ascensão.

Já em 2008, Stan Van Gundy, reputadíssimo treinador da equipa dos Orlando Magic da NBA, manifestava a sua preocupação pelo caminho que a formação de jovens talentos basquetebolistas estava a tomar nos Estados Unidos da América. Como nunca na América importam-se basquetebolistas europeus. 

Para Van Gundy a explicação é bastante simples. Falhas graves na formação dos atletas. Em traços gerais, afirmou Gundy que os treinadores não ensinavam o jogo aos miúdos. Os mais altos e com maior potencial físico quando atingiam a maioridade nem sabiam driblar porque enquanto crianças tudo o que lhes era solicitado era que ganhassem ressaltos e de imediato passassem a bola aos mais habilidosos. 

Em suma, para vencer, os treinadores coarctavam as possibilidades de desenvolvimento dos atletas. 

E esta é uma problemática transversal a imensos desportos. Nomeadamente o futebol, sobretudo em Portugal. Há não muito a Federação Francesa considerou a criação de cotas no acesso aos clubes por forma a proteger os talentos que cada vez menos são formados em detrimento do físico e mecânico. 

Observamos a selecção nacional e percebemos que o tempo da criatividade e do talento já lá vai. Tudo hoje é muito e apenas físico, sendo fácil perceber a queda drástica de qualidade que vivemos desde as selecções que nos representaram em 2000 e em 2004. 

É uma problemática que deve ser tida em conta por todos os treinadores da formação. Que merece uma reflexão aprofundada, porque o futuro do futebol em Portugal é deles que depende. Bastante mais do que de qualquer outro treinador conceituado de futebol profissional. 

´Os melhores treinadores devem estar na formação´ afirmou em tempos o excelente José Curado. 

E assim o é, de facto. Não basta perceber do jogo. Há que mais do que nunca ter qualidade na operacionalização do treino (não esquecer a importância que o jogo deve assumir nestes momentos, por forma a potenciar ao máximo o tempo de empenhamento motor, ao contrário das tradicionais filas de espera), e no identificar e trabalhar de forma acérrima os jovens que denotem maior potencial. 

Quantos são os treinadores que optam pelo pouco apto e sem potencial atleta apenas porque lhe garante golos de livre do meio campo? Quantos jovens cheios de talento ficam para trás porque não viram as suas capacidades potenciadas por estarem tapados por outros que já se sabe nunca terão hipóteses de sobreviver quando a selecção estreitar, mas que no momento por terem uns bons quilos a mais resolvem de bola parada? 

Chega sempre o momento em que quem se evidencia apenas pelo físico não tem mais nada para dar e acaba fora da competição. E quantos ficaram para trás ou não atingiram a plenitude das suas capacidades porque o seu caminho foi sempre tapado por menos capazes que se evidenciavam por chutar mais alto e mais forte? É que de ano para ano os guarda redes crescem e as diferenças físicas que tanta desigualdade promovem nas crianças esbatem-se. Quando tal acontece é tempo dos talentosos se afirmarem. Mas quantos destes não se desenvolveram por incompetência dos seus treinadores? 

E vencer não tem de surgir em oposição ao formar. Tudo o que os treinadores precisam é de um bom plano para gerir condignamente (seja em treino, seja na competição) a formação de uns e outros. Quando se trabalha na formação, sobretudo com crianças há que perceber que o individual é importante. As estrelas, o foco é sobre as crianças e não sobre os modelos de jogo mecânicos e coarctadores que idealizam. 

Há pouco, um caro amigo, responsável pela prospecção de um grande nacional partilhou uma história deveras interessante, que a todos devia fazer pensar.

Em conversa com o treinador dos s19 e coordenador do Schalke, ficou a saber que Draxler chegou aos juniores aos 15 anos, porque já era um talento. Mas, não sabia defender e não queria. fugia dos duelos, mas continuava a marcar e a desequilibrar em todos os jogos. O treinador insistia com ele para a necessidade de saber defender, porque ali não fazia diferença, mas nos séniores, teria que o fazer. Como é natural ele não o ouvia. Um dia Draxler foi colocado como trinco. “…até ao final da época, este é o teu lugar” Muita azia do Draxler, mas forçado lá jogou a trinco. Nos primeiros jogos, perderam quase sempre por culpa dele. Os colegas começaram a cair em cima do miúdo que teve que melhorar e muito. Tanto que no final da época parecia que toda a vida tinha jogado naquela posição. Hoje, é um dos melhores alas do mundo! Valeram bem aquelas derrotas… certo?
Sobre Paolo Maldini 3828 artigos
Pedro Bouças - Licenciado em Educação Física e Desporto, Criador do "Lateral Esquerdo", tendo sido como Treinador Principal, Campeão Nacional Português (2x), vencedor da Taça de Portugal (2x), e da Supertaça de Futebol Feminino, bem como participado em 2 edições da Liga dos Campeões em três anos de futebol feminino. Treinador vencedor do Galardão de Mérito José Maria Pedroto - Treinador do ano para a ANTF (Associação Nacional de Treinadores de Futebol), e nomeado para as Quinas de Ouro (Prémio da Federação Portuguesa de Futebol), como melhor Treinador português no Futebol Feminino. Experiência como Professor de Futebol no Estádio Universitário de Lisboa, palestrante em diversas Universidades de Desporto, Cursos de Treinador e entidades creditadas pelo Instituto Português do Desporto e Juventude (IPDJ). Autor do livro "Construir uma Equipa Campeã", e Co-autor do livro "O Efeito Lage", ambos da Editora PrimeBooks Analista de futebol no Canal 11 e no Jornal Record.

Seja o primeiro a comentar

Deixe uma resposta

O seu endereço de email não será publicado.


*