Futebol sem tempo para digestões

Depois de um ataque, teríamos gostado de ter mais tempo para digerir o que aconteceu. E não nos deram tempo. Disseram-nos: amanhã têm de jogar. […] Ninguém nos perguntou a nossa opinião, decidiram isto na UEFA, na Suíça. Minutos depois do ataque, disseram-nos que tínhamos de jogar, como se tivessem atirado uma caneca de cerveja contra o autocarro

Thomas Tuchel 

Será possível que menos de 24 horas depois de terem sido vítimas de um ataque à bomba, os jogadores do Borussia Dortmund estavam preparados para jogar um encontro dos quartos-de-final da Liga dos Campeões? Você estaria? Não me parece.

Thomas Tuchel tem a certeza que não. A sua equipa não foi ainda capaz de digerir o que aconteceu no dia de ontem. Marc Bartra está ainda hospitalizado depois de ter sido operado a um um pulso fracturado, para além dos destroços de vidro nos braços.

O espectáculo, esse, tinha de continuar? Há algo de profundamente errado nesta noção de que o futebol é mais importante do que tudo. Não é. Nem os quartos-de-final da Liga dos Campeões. Sobretudo se aqueles que têm que o jogar não estão com a cabeça pronta para o fazer.

Colocados perante a hipótese de não jogar, conforme anunciou o treinador, nenhum jogador se colocou de fora do encontro. Há uma regra não escrita nos balneários que dizem que qualquer demonstração de fragilidade te torna inaceitável no grupo. Tinha sido fundamental que alguém, numa posição externa, tivesse percebido que certas coisas precisam de tempo.

Hoje teria sido o dia.

PS – Acrescente-se a flash interview de Nuri Sahin

Sobre Luís Cristóvão 103 artigos
Analista de Futebol. Autor do Podcast Linha Lateral. Comentador no Eurosport Portugal.

13 Comentários

  1. Boa noite,

    Desde já agradeço a disponibilidade deste artigo, é um assunto que pouca gente visualizou. Visto que o Mónaco ganhou favoritismo pela sua vitória contra o Man. City, onde na minha óptica apresenta uma estrutura defensiva muito menos “vertical” que a questão do Borussia Dortmund que tem uma excelente capacidade de colocar o jogo com muita pressão à zona do seu adversário, não permitindo ganhar flexibilidade. É óbvio que este jogo, sentiu-se um peso de consciência em certos determinados lances que provocou o “deitar a toalha” ao chão mais depressa do que os jogos anteriores que esta equipa já tinha realizado, principalmente o jogo contra o Bayern (Bayern que foi o peso psicológico da superioridade), mas por exemplo contra o Schalke, o Borussia apresentou-se um nível mais estável. E se compararmos a postura dos jogadores, para o jogo de hoje, a diferença é inigualável e sem descrição. Notou-se que o incidente da bomba, foi uma das causas dos processos defensivos da equipa da casa (que nunca jogou assim na minha opinião, no decorrer da época). Outra coisa que Tuchel teve mal, visto que os titulares, com o incidente mostraram mais dificuldades com o jogo e a entrada de Pulisic e Nuri Sahin, fez com o Dortmund ganhasse mais flexibilidade ofensiva, mas a raiz do seu eixo defensivo já tinha sido arrancada pelo próprio psicológico da equipa.

    Excelente artigo e excelente trabalho.

    Votos de uma boa carreira.

    Henrique Silva

  2. Quando o camião rebentou com o mercado de natal em Berlim no dia seguinte o mercado estava aberto. A melhor resposta a um ataque destes é continuar a vida normalmente. Afinal de contas, se o primeiro remate do Borussia tivesse entrado e galvanizado a equipa para a vitoria todos estariam a falar de como o ataque os inspirou.

    • Ia responder ao comentario anterior e ao post, mas vejo teu post e ai esta minha resposta.
      Infelizmente, estas situacoes continuam a acontencer, os jogadores sao como qualquer outro profissional, noutra qualquer area, seres humanos que depois destes acontecimentos tem que voltar ao trabalho e olhar em frente.
      Mas o ponto aqui e o jornalista, que faz enfase ao acontecimento de ontem, diria porque a equipa perdeu, e se tivessem ganho!? Estariamos na presenca de 11 spartans do Dortmund!?
      Infelizmente o mundo nao e perfeito, e diria que ao jogarem hoje (sem estas desculpas no final) para mim e um sinal de grande forca e caracter, e tambem respeito por todos aqueles que se deslocaram para ir ver o espectaculo.

  3. Bom post. Em Portugal já se jogou uma final da Taça de Portugal minutos depois de terem morto um adepto na bancada. Os jogadores terão sabido do acontecimento ao intervalo e mesmo assim foram a jogo para a 2a parte.
    “Tinha sido fundamental que alguém, numa posição externa, tivesse percebido que certas coisas precisam de tempo.” Infelizmente, ainda não foi hoje o dia. Abraço, João Barata

  4. Comentadores deste post:
    – Corre-vos sangue nas veias?? O que é que se passa com os Portugueses? Que valores são estes?
    …o Mónaco devia ter-se solidarizado com o Dortmund, que se encontrava nitidamente debilitado (percebesse perfeitamente pelas declarações do Sahin)…
    “O Futebol é essencialmente humano!” diz Manuel Sérgio, e eu acrescento: como a Vida devia ser….

    • Pedro, o Mónaco pediu que o jogo fosse adiado para sábado… foi a UEFA quem não permitiu.

      Sobre isto: claro que os incidentes ainda estariam na cabeça dos jogadores. No dia a seguir aos atentados de Berlim, o mercado voltou a abrir. Mas quantas daquelas pessoas que lá passeavam estavam lá no dia anterior (nem sei se os proprietários de lojas lá estariam)? E para além disso, não se compara a pressão de um jogo de futebol com um passeio no parque.

      Os jogos da Liga dos Campeões deveriam ter seguido, como seguiram, nos outros campos. Mas a coisa humana a fazer era adiar este, especificamente, para mais tarde.

      Belo e pertinente post. Abraço

      • Ricardo, obrigado pela informação, que desconhecia, mas que aplaudo…
        ….de resto 100% de acordo, especialmente no “Belo e pertinente post”….
        …mas muito preocupado com a frieza das pessoas…as minhas interrogações são pertinentes e assustadoras….

  5. A quem acha bem que o jogo tivesse sido realizado, relembro que não foi um ataque na cidade de Dortmund, foi um ataque à EQUIPA do Dortmund!!

    Imaginem-se dentro dum autocarro e explodirem 3 granadas à volta deste! O terror que deve ser! Vocês dormiam nessa noite? Porra! Quantas centenas de telefonemas e mensagens acham que os jogadores receberam nessa noite? O stress que deve ter sido e com toda a azáfama à volta deles com certeza que não conseguiram descansar devidamente! Não estavam em condições para trabalhar, ainda por cima num jogo desta importância. Vocês queriam ser operados por um cirurgião que tivesse estado naquele autocarro, no dia seguinte? Na mesma cidade ainda vá, mas por alguém que foi vítima directa do ataque? Esteve muito mal, a UEFA.

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