Mesmo sem futebol, com uma equipa pensada na base do músculo, da correria, da força, e sem qualquer dinâmica ofensiva, que não dois, por vezes três jogadores sozinhos contra o mundo, Ilídio Vale chega à final do mais importante torneio mundial de futebol jovem.
O jogo tem destas coisas. Nem sempre os capazes, audazes e mais competentes triunfam. Defender com todos, sem ter a mínima capacidade para sair em contra-ataque, é muito diferente de ser-se bom tacticamente. Rezar pela sorte nos penaltys, ou numa qualquer bola parada, não é estratégia ou astúcia. É apenas a negação do que é o futebol. Como milhentas outras equipas, é assim que a de Ilídio Vale se apresenta nos campos por onde passa. Ao contrário de (quase) todas as outras que acabam invariavelmente por cair em desgraça, a selecção portuguesa segue o seu caminho, cada vez mais próximo daquele que nos foi permitido ver de tão perto, no Europeu de 2004, pelos comandados de Rehhagel.
O treinador grego não se tornou competente por ter tido a felicidade de sagrar-se campeão europeu, numa equipa sem um pingo de competência. Por vezes, o futebol é mesmo isto. Em tantas equipas que se negam a valorizar o jogo, de muitos em muitos anos, há uma que é bem sucedida. E todos devemos estar gratos à felicidade que é, vermos uma das nossas nesse lote. Em Inglaterra, por exemplo, continuam a ser três as equipas que com um futebol à Ilídio, chegam à Primeira Liga todos os anos. Os treinadores dessas equipas, no ano seguinte voltam aos habituais insucessos. A sorte, por vezes, também acompanha quem não merece. Relembre também Jaime Pacheco.
Mika, Cédric, Nuno Reis, Caetano e Nelson Oliveira mereciam ter prazer no que fazem. Tal tem-lhes sido negado, por um modelo de jogo absurdo, que os faz esperar pelo incerto destino. Eles, e todos os outros que mesmo com menos talento, e à deriva em campo lutam com uma obstinação própria dos campeões merecem o troféu maior. O sacrifício de estarem há mais de um mês sem jogar futebol, deveria ser recompensado. A forma emocionante como celebram cada triunfo coloca cada um dos convocados no coração dos portugueses. A gloria não será fácil, todavia. Impedir o talentoso Brasil de chegar ao golo será tarefa hercúlea.
Dos fracos não reza a história. E todos estaremos cá para seguir os sucessos futuros de quem merece, e avaliar a competência de quem foi à boleia do talento e espírito de entrega de bravos guerreiros.
P.S. – Curiosa a nova corrente de opinião que justifica a incapacidade portuguesa para dar mais de dois passes consecutivos, com a péssima qualidade dos seus intervenientes. Há, é certo, uma inegável e notória falta de talento, particularmente nos centrocampistas, mas somente porque se decidiu levar os fundistas em detrimento dos futebolistas. Tal não poderá servir de justificação para os horrores nos momentos ofensivos a que vamos assistindo a cada jogo. Se por aqui, logo no final da primeira fase, se nomearam cinco portugueses para os trinta melhores do torneio (tantos quanto o Brasil, por exemplo), não foi por patriotismo, ou por se crer que a falta de qualidade seja assim tão acentuada em todos os mundialistas.
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