Que venha o mundial

O Benfica fez mais uma grande temporada, tal como no ano anterior. A diferença foi ter conseguido superar-se nos momentos de decisão. O grande mérito deste ano, para além da óbvia super organização de Jesus, é dos jogadores. Conseguiram motivar-se, por forma a dizer presente nos momentos importantes. Fico com alguma pena por Jesus, ainda, não ter conquistado uma prova europeia. Mas com a certeza de que no futuro, com a qualidade certa, estará a disputar a liga dos milhões, como grande candidato. O domínio interno não é de estranhar, tendo em conta as melhorias que teve no plantel, e a falta de um adversário à altura.

Como seria de esperar, e depois de tudo o que foi sendo dito sobre a mais valia que um treinador de qualidade representa, o Porto  fez uma época para esquecer. Sem qualidade nos seus processos de jogo, com muitos problemas de liderança, e com uma crença absoluta que a situação poderia ser resolvida por um milagre (Quaresma). Se este ano ensinou (ou não) alguma coisa aos adeptos do futebol, é que o sucesso de uma instituição futebolística começa na escolha da figura do treinador. E que quando o treinador não consegue operacionalizar a sua ideia, ou quando a ideia não tem qualidade, até os melhores (Fernando, Lucho, Otamendi, Alex, Danilo) parecem jogadores banais. Espero que se tenha aprendido a lição.

O Sporting fez uma maravilhosa temporada ao nível dos resultados. Sem qualidade de jogo superior, mas com uma percentagem de vitórias muito alta. Para isso contribui o grande trabalho de Leonardo Jardim na reorganização da equipa, com melhores princípios que no passado. Ainda que com qualidade inferior aos anos anteriores, ganhou mais. O modelo carece de grandes melhorias, e há muito por onde evoluir. Este ano esteve na luta pelo título, e deverá ser esse o objectivo da próxima temporada. Continuar a lutar pelos primeiros lugares. De forma sustentada, e com uma aposta mais forte em alguns jogadores sub-aproveitados este ano (Dier, A.Martins, Montero, Vítor), o Sporting poderá escalar uma trajectória firme e segura, para que se aproxime definitivamente de Benfica e Porto. Mas para isso, deve cingir-se à realidade, e essa diz que ainda estão qualitativamente longe dos principais rivais.

Menção honrosa para Nuno Espírito Santo que consegue colocar o Rio Ave em duas finais. E, sobretudo, para Marco Silva que manteve o Estoril bastante competitivo, e com um modelo de jogo muito agradável.

Em Espanha o Atlético de Madrid sagrou-se campeão, tendo batido na regularidade Real Madrid e Barcelona. Prémio justo para Simeone, que trabalhou uma equipa para que fosse o reflexo exacto das ideias sobre o futebol. Capacidade de superação, agressividade, e organização defensiva. A equipa vive das bolas paradas, erros dos adversários, e inspiração individual dos seus atletas, do ponto de vista ofensivo. Mas, conseguiu com uma motivação fantástica, tornar-se numa equipa forte, e muito perigosa para as grandes potências. A presença na final da Liga dos Campeões é “normal” sendo que o estilo de jogo que pratica é talhado para esse tipo de provas.

Curioso para ver Simeone na próxima época (seja ela no Atlético ou não).

O Barcelona de Martino foi aquilo que se esperava. Do pouco que conhecia de Tata, percebia-se de início que tinha tudo para dar errado. Conceitos muito pouco adequados para os jogadores em questão. Bolas longas, cruzamentos, jogar nas segundas bolas, etc. Má gestão do plantel, no sentido de não ter sabido motivar todos os jogadores, dando claramente a entender que alguns só serviam para jogar quando outros não estavam. Não foi à guerra com todos, não conseguiu extrair o melhor dos melhores, não percebeu que se há equipa em que não faz sentido apostar em “duelos” individuais, com disputas de bola nomeadamente no jogo aéreo, é o Barcelona. A época termina com a frustração de perder o campeonato perante os seus adeptos, e não podia haver final mais irónico que esse.

O Real Madrid de Ancelotti está nas bocas do mundo. Parece unânime que é uma grande equipa. E assim o é. Mas não por ter um colectivo fantástico, ou uma organização ímpar. A força deste Madrid, está na grande qualidade das suas individualidades. O grande mérito de Ancelotti é, “só”, o colocar das peças certas nas posições certas. E está no retirar da responsabilidade dos jogadores, para que possam jogar o mais relaxados possível. A organização defensiva da equipa é banal, a construção dos ataques também. Está organizado, mas não é nada particularmente forte. Estou, também, bastante curioso para ver a evolução da equipa na próxima época.

Em terras de sua majestade o campeão foi aquele que se esperava. O Manchester City de Pellegrini conseguiu superar a concorrência e levar dois canecos. A mais valia individual que tem é evidente. Mas, carece, também, de melhorias ao nível do modelo de jogo. Esteve no seu primeiro ano a adaptar-se às exigências do contexto (País, cultura, mentalidade do adversários, expectativas dos adeptos, plantel). Pelo que se espera um segundo ano mais forte, e com uma afirmação forte em termos de modelo de jogo.

O Liverpool é a sensação desta época. Discutiu taco a taco o título com o Chelsea e City, tendo superado Arsenal, Manchester United e Tottenham, ainda que sem a capacidade financeira dos citados. Grande mérito para o trabalho de Rodgers, que conseguiu extrair mais do que aquilo que os seus jogadores realmente valem. Para o futuro, tentar perceber se conseguirá manter os índices competitivos, sobretudo melhorando a organização defensiva.

José Mourinho acabou a época como o “sad one”. Começou com um discurso fantástico, de que queria mudar a mentalidade da equipa, ao nível de jogo, a mentalidade dos jogadores, queria assumir o jogo, e voltar a jogar como equipa grande. No final, acabou com zero troféus, ainda que tenha adulterado completamente a ideia inicial, em detrimento dos resultados. Coisa que disse peremptoriamente que não iria fazer. O resultado foi que, nem conseguiu evoluir o modelo na direcção que queria, nem ganhou nada. Ele diz que na próxima temporada o Chelsea será campeão, vamos seguir atentamente a evolução do processo.

O Arsenal, depois de mais uma época com muitas lesões, não conseguiu manter-se na luta pelo campeonato até ao final. Pede-se a Wenger que reveja a sua metodologia de treino, sabendo-se que tanta lesão não traumática, ano-após-ano, é consequência do processo. Pede-se, também, que evolua as referências defensivas que utiliza há anos. Se possível, nas compras, que passe por Portugal e que leve Alex Sandro, e Danilo, seriam reforços importantes para atacar a próxima temporada.

O Tottenham despediu Villas-Boas para contratar Sherwood. Mostra isso que quem o demitiu, o fez pelas razões erradas. O futebol da equipa era fraco, mas a equipa era minimamente organizada. Depois disso, além de não ter melhorado o futebol, veio a desorganização. Fica na retina o falhanço de AVB, quando tinha “tudo” para fazer uma temporada melhor que a anterior, se realmente conseguisse que a equipa jogasse aquilo que ele dizia que queria jogar.

Menção honrosa para Roberto Martinez. Com uma proposta de jogo maravilhosa, conseguiu guiar o Everton numa época muito boa, sem que alterasse o seu modelo, mesmo jogando contra os tubarões.
Sobre a sucessão de Sir. Alex, que tenham aprendido que no futebol de hoje, é preciso ter alguém que perceba de futebol no comando da equipa. A próxima escolha vai ditar se a direcção aprendeu alguma coisa com a experiência deste ano.

Na Itália e em França, tudo normal. Juventus e PSG, com planteis muito acima da concorrência, mantêm o domínio interno. E assim deverá continuar, mesmo que os modelos de jogo de cada uma dessas equipas não seja o melhor. O problema dessas equipas aparecerá quando os adversários forem de nível europeu, e apresentarem excelentes organizações.

O Bayern de Guardiola fez uma época normal. A nível interno dominou, como se espera sempre de Guardiola. Na regularidade será sempre muito difícil bater o treinador espanhol. Entre a paragem do campeonato alemão, e o recomeço do mesmo, as mudanças estruturais que Guardiola apresentou mostraram-se danosas. Bem como os índices de concentração dos seus jogadores. Ao que parece, ter ganho o campeonato demasiado cedo fez mal aos alemães. Ainda assim, percebem-se as dificuldades que Guardiola está a ter em implementar a sua filosofia, nem sempre entendidas pelos jogadores. Como ele diz, foi a temporada mais difícil da carreira dele, porque ainda não conseguiu (tendo a época terminado) convencer os seus jogadores das suas ideias. Espera-se um Bayern muito melhor na próxima época.

O Dortmund sofreu uma onda de lesões sem precedentes na história. A equipa de Klopp é ainda das mais interessantes da Europa, mas a qualidade que teve disponível durante largos meses da época foi fraca. Pelo que é de esperar que na próxima época cause mais dificuldades ao Bayern, tornando a luta pelo campeonato bem mais animada. Klopp tem uma equipa que se organiza muito bem em todos os momentos do jogo, e que dá resposta na defesa e no ataque com muita qualidade.

Sobre Paolo Maldini 3828 artigos
Pedro Bouças - Licenciado em Educação Física e Desporto, Criador do "Lateral Esquerdo", tendo sido como Treinador Principal, Campeão Nacional Português (2x), vencedor da Taça de Portugal (2x), e da Supertaça de Futebol Feminino, bem como participado em 2 edições da Liga dos Campeões em três anos de futebol feminino. Treinador vencedor do Galardão de Mérito José Maria Pedroto - Treinador do ano para a ANTF (Associação Nacional de Treinadores de Futebol), e nomeado para as Quinas de Ouro (Prémio da Federação Portuguesa de Futebol), como melhor Treinador português no Futebol Feminino. Experiência como Professor de Futebol no Estádio Universitário de Lisboa, palestrante em diversas Universidades de Desporto, Cursos de Treinador e entidades creditadas pelo Instituto Português do Desporto e Juventude (IPDJ). Autor do livro "Construir uma Equipa Campeã", e Co-autor do livro "O Efeito Lage", ambos da Editora PrimeBooks Analista de futebol no Canal 11 e no Jornal Record.

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