As substituições

Por serem os treinadores tidos como deuses capazes de influenciar o jogo no decurso do mesmo, de uma forma que na realidade, simplesmente não influenciam (a menos que mudando sistemas / dinâmicas, que naturalmente terão de estar previamente trabalhadas no treino), muito se tende a olhar para as substituições como uma forma de mudar radicalmente o curso de uma partida. E tantas são as vezes em que se pretende usar tais decisões para explicar o resultado. Sejam as alterações promovidas ou as que ficaram por fazer. Como se pode sequer ousar pensar que excepto por uma enorme aleatoriedade, passível de acontecer com qualquer um dos outros vinte e um jogadores em campo, alguém que não foi uma primeira opção poderá mudar totalmente um jogo? E por mudar, não referente ao estar ou não no golo, mas trazer um número de acções significativas em quantidade e qualidade que o destaquem de tal forma para mesmo sendo um entre vinte e dois, mudar tudo o que era a partida até ai. Porque empurrar a bola lá para dentro, tanto pode empurrar quem entra como quem saiu, se não tivesse saído! Isso, será sempre apenas uma acção!

Substituições vistas como uma espécie de recurso semelhante à lotaria. Estás a perder? Terás de trocar alguém por um dos que está sentado no banco para virar o jogo. Estás a ganhar? Terás de colocar alguém fresco no meio do campo. Nos últimos minutos não se devem fazer! Há toda uma cartilha de bancada que não tem qualquer paralelo com a realidade.

Não significa que não se possa ou deva promover alterações no decurso do jogo. Simplesmente, não é como jogar na lotaria. Este não deu, meto o outro. Por exemplo, se o Avançado X é melhor que o Y, porque se há de partir da ideia de que se X não marcou golo nos primeiros setenta minutos, terá então menores probabilidades de o fazer que Y nos vinte minutos finais? Afinal, se fisicamente estará disponível e a fadiga ainda não quebra de sobremaneira o rendimento, X continua a ser melhor que Y! Logo, mais próximo de ajudar a equipa estará do que quem ficou de fora.

Imaginando que as capacidades físicas não estão deterioradas o suficiente para que a perda de rendimento torne as primeiras opções inferiores às segundas. Se o jogo prossegue com as mesmas características (tempo em organização / transição ofensiva / defensiva com que iniciou) porquê mudar, quando isso será trazer a jogo alguém que na avaliação inicial do treinador, quando seleccionou o onze, dará menos à equipa?

Até ao minuto oitenta e oito, Klopp só tinha feito uma substituição na recepção ao City. Se o empate surgisse, Portugal lembraria que o treinador Alemão não reforçou o meio campo, ou não meteu ninguém “fresco” para segurar o jogo. Ignorando que se o jogo estava a ir de encontro ao que o treinador idealizou, então os que foram primeiras opções, não estando exaustos, continuaram ao longo do jogo a ser os que mais probabilidades davam ao Liverpool para ser bem sucedido. Afinal, se Klopp os escolheu!

Já a opção de Guardiola por não substituir ninguém durante oitenta e cinco minutos, deverá ser tida como uma blasfêmia. Seguramente a razão para não ter virado o jogo. Isto por quem de facto, não só não percebe o que se passa no jogo, como nunca teve que tomar decisões num decurso de um mesmo. Se quando optou por uma estratégia que lhe permitisse ir atrás da vitória, fez determinadas escolhas, porque iria Guardiola com o decorrer do jogo sentir que a mudança de um jogador por outro, iria surtir efeito na forma como alteraria o jogo? Os treinadores escolhem a estratégia que acreditam ser melhor, com aqueles que consideram os melhores jogadores. Trocar por trocar só significará que não se acredita assim tanto em si próprio e no trabalho que se desenvolve. Que se acredita mais em Deus e na sorte, que em escolhas ponderadas!

Significa então que não se devem fazer substituições, ou fazer menos?

Claro que não!

Tudo dependerá do contexto próprio de cada jogo. Poderemos no entanto definir algumas condições óptimas para que estas surjam com o devido enquadramento, que não o do procurar a sorte.

a) Perda de qualidade no jogo por parte de um jogador em específico por falência de fadiga ou de confiança;

b) Mudança das características do jogo, que poderão beneficiar mais determinadas características que algum dos jogadores que iniciou a partida de fora tenha. Por exemplo. Em função do resultado, a equipa está a passar mais tempo em determinado momento do jogo que o que seria expectável e faz mais sentido ter alguém mais capaz naquele momento específico, mesmo que no computo geral seja inferior ao colega.

c) Gerir a felicidade dos atletas (importante relembrar que tais decisões poderão afectar a dos que saem! E portanto, também ai é decisivo gerir com assertividade (a que minuto? quem sai? e porquê?). É fácil gritar que o jogo está ganho e que deve entrar cedo X ou Y, quando não se sabe como Z ou V se sentirão por ter menos minutos depois de tanto se esforçar para resolver o jogo cedo…e Z ou V, continuam a ser os mais decisivos… afinal se são eles que estão a entrar de início…)

E só o ponto C será suficiente para em todas as partidas se esgotarem as substituições. Desde que com o resultado seguro, naturalmente.

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Sobre Paolo Maldini 3828 artigos
Pedro Bouças - Licenciado em Educação Física e Desporto, Criador do "Lateral Esquerdo", tendo sido como Treinador Principal, Campeão Nacional Português (2x), vencedor da Taça de Portugal (2x), e da Supertaça de Futebol Feminino, bem como participado em 2 edições da Liga dos Campeões em três anos de futebol feminino. Treinador vencedor do Galardão de Mérito José Maria Pedroto - Treinador do ano para a ANTF (Associação Nacional de Treinadores de Futebol), e nomeado para as Quinas de Ouro (Prémio da Federação Portuguesa de Futebol), como melhor Treinador português no Futebol Feminino. Experiência como Professor de Futebol no Estádio Universitário de Lisboa, palestrante em diversas Universidades de Desporto, Cursos de Treinador e entidades creditadas pelo Instituto Português do Desporto e Juventude (IPDJ). Autor do livro "Construir uma Equipa Campeã", e Co-autor do livro "O Efeito Lage", ambos da Editora PrimeBooks Analista de futebol no Canal 11 e no Jornal Record.

3 Comentários

  1. Boas Pedro. Mas estando a perder como o City estava, e não conseguindo contrariar o liverpool não seria de esperar que a alteração que ele fez aos 89 fosse mais cedo? o jogador que entrou nem tocou na bola.

  2. Respeito mas não concordo. A filosofia vigente de que o futebol é uma ciência para mim é absurda… Diminuir a aleatoriedade e transformar o jogo num conjunto de processos e procedimentos robitizados a meu ver não é o caminho. E desta forma se têm perdido grandes jogadores, porque simplesmente querem transformar a simplicidade de jogar futebol numa autêntica realidade kafkiana… Nem 8 nem 80

  3. “alguém que não foi uma primeira opção poderá mudar totalmente um jogo”

    Quantas e quantas vezes isso acontece.

    Guardiola mexeu aos 85 minutos pq então? Lesão, fadiga ou tentativa real de mudar qqr coisa uma vez que a estratégia inicial falhou?

    Não faz sentido essa relutância com as substituições.

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