Ver para lá do resultado. A final da Taça da Liga.

A final da Taça da Liga sorriu ao Sporting, com uma vitória alcançada nos pontapés da marca de grande penalidade. Mas para lá do resultado, interessa perceber o que se passou para levar a este desfecho.

Quando fiquei a conhecer o onze do Sporting, percebi a ideia de Jorge Jesus até tendo como comparação o último jogo entre ambas as equipas para o campeonato. Jesus, privado das acelerações e da vertigem e velocidade que Gélson oferece ao jogar do Sporting, montou uma equipa recheada de jogadores com criatividade do meio campo para a frente (à excepção de Bas Dost), jogadores com capacidade para ter bola, mas também com pouco “andamento” e agressividade nos momentos defensivos. No entanto, o Sporting teve muitas dificuldades em ligar as suas fases ofensivas em ataque posicional e se há essa dificuldade em ligar e criar em termos ofensivos (e na minha opinião, este problema não é de agora), obviamente que nos momentos defensivos, a equipa se irá ressentir e foi isso que aconteceu na primeira parte.

Jorge Jesus pretendeu com a entrada de Bryan Ruiz e Rúben Ribeiro, para além da inclusão de Montero (ainda com pouca mobilidade), ter capacidade para ter bola, para ter jogo interior e criar desequilíbrios entre a linha média e defensiva sadina se a bola aí entrasse e houvesse espaço para enquadrar, ao mesmo tempo que os laterais Fábio Coentrão e Piccini ofereciam largura e poderiam criar desequilíbrios no corredor lateral com combinações directas. Raramente isso aconteceu e quando aconteceu, não houve muito critério na última decisão. Aliás, isto mesmo foi mencionado pelo treinador leonino.

Aos posicionamentos sempre bem definidos no modelo de Jorge Jesus em organização ofensiva, faltou ao Sporting ter mais paciência na sua construção, ligar construção com criação e criação com finalização. Para isso, com bola há que mover o adversário até haver espaços para entrar e criar. Raramente isso aconteceu, o Sporting forçava um corredor lateral e perdia a posse, quando tinha capacidade para variar para outro corredor, não criava superioridades que lhe permitissem criar esses desequilíbrios. Aos movimentos interiores de Ruben Ribeiro e Bryan Ruiz, havia a projecção de Piccini e Coentrão mas sobretudo no corredor direito, Montero apareceu ainda pouco dinâmico e longe do que pode oferecer, mostrando-se pouco entre linhas e longe das combinações curtas quer nesse corredor lateral, quer no corredor central. Essa pouca consistência na sua organização ofensiva em ataque posicional, perante um Vitória estrategicamente com ideias bem definidas e sempre agressivo no encurtamento ao portador, originou problemas ao Sporting que teve muitas dificuldades em criar situações de finalização.

Aos problemas do Sporting em organização ofensiva, há também mérito na forma como o Vitória condicionou o Sporting. Não defendendo com um bloco demasiado baixo (apenas na segunda parte), antes com o mesmo numa zona intermédia, procurou condicionar o raio de acção quer de William quer de Bruno Fernandes, fechando espaços quer nas costas da sua primeira linha de pressão, quer em zonas mais laterais onde William e Bruno assumem a construção. Assim, na primeira parte, estes pouco participaram no processo ofensivo leonino. Para além disso, nos pontapés de baliza condicionou e “obrigou” o Sporting a bater longo e sabendo-se que Bas Dost é a referência no futebol directo leonino, José Couceiro colocou Semedo na disputa desses lances, ficando a linha defensiva mais protegida e sem necessidade de sair a disputar. Com jogadores com capacidade para ter bola, mas sem a velocidade para atacar a profundidade como eram os do Sporting, o Vitória esteve confortável na primeira parte sem estar demasiado baixo e fazia de cada saída, um convite à criatividade de Gonçalo Paciência e João Teixeira, jogadores que com o seu talento, capacidade técnica e irreverência, foram um problema para a última linha leonina.

A segunda parte trouxe a entrada de Battaglia e Acuna para jogo e a uma mudança de posicionamentos no Sporting. Batta estabeleceu-se na posição 6, não sendo um jogador criativo e assertivo com bola, é claramente muito forte nos momentos defensivos, sobretudo na transição defensiva quer para sair a apertar logo após perda, ou em situações em que a pressão é batida, saber reajustar no corredor quando o lateral sobe ou no corredor central, se central é obrigado a deslocar-se ao corredor lateral. Bruno Fernandes passou para a direita, mas com instruções para se mover por dentro, William subiu no terreno para a posição 8 e Acuna como habitualmente ocupou o corredor esquerdo. O que mudou? Mudou sobretudo a agressividade sem bola, quer em transição defensiva quer em organização defensiva e sobretudo a capacidade do Sporting pressionar. Ofensivamente, o Sporting conseguiu ser mais incisivo, nem sempre com o melhor critério, nem sempre com a paciência necessária para fazer mover o adversário e encontrar os espaços para entrar no último terço, mas com maior dinâmica e intensidade nos corredores, e foi quase sempre por aí que conseguiu desequilibrar na segunda parte até à igualdade final nos 90 minutos. Nas grandes penalidades, foi claramente mais competente e preparado e venceu a Taça da Liga.

Destaques individuais do lado leonino para Mathieu, pela capacidade que tem em construir e pelas ligações que cria pela esquerda, para lá da serenidade e capacidade nos momentos defensivos e para Bruno Fernandes que, apesar de apagado durante toda a primeira parte, na segunda jogando numa posição onde eu entendo que não tem o rendimento que a sua qualidade pode dar, foram criadas por ele quase todas as situações de perigo do Sporting na segunda parte. Do lado do Vitória, os já destacados Gonçalo Paciência e João Teixeira. O primeiro, não só pela excelente execução no golo, mas por toda a qualidade técnica e criatividade com bola que oferece ao jogar dos sadinos (será desta Gonçalo?), o segundo porque deu água pela barba em cima de Piccini criando situações de desequilíbrio individual e sendo sempre também uma referência com bola nas saídas sadinas para o ataque.

Sobre José Carlos Monteiro 47 artigos
Treinador de Futebol, Uefa B, com percurso e experiência em campeonatos nacionais nos escalões de formação. Colaborador como observador e analista em equipas técnicas na Primeira Liga. Alia a paixão pelo treino e pelo jogo à analise de jogo.

4 Comentários

  1. A realidade é que não jogámos a ponta de um corno, foi mesmo horrível.

    Mantenho que o 11 inicial foi bem escolhido, mas implica mais compromisso defensivo, achei essencialmente que os jogadores esperavam um Setúbal como no jogo da oliveirense e quando deram por ela quase que entregavam a taça.

    Uma pena, porque vem dar razão ao Jorge Jesus quando utiliza um perfil mais físico de jogador.

    E eu queria mesmo que ela tivessem provado ao jota que ele estava errado, assim vamos ter que levar com Battaglia o tempo todo.

    Boa análise.

    Um abraço

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