Sporting táctico – Como Jorge Jesus preparou o Sporting para se superiorizar ao Atlético

O jogo da passada quinta feira em Alvalade, mostrou um dos melhores jogos do Sporting nesta temporada. Privado de alguns jogadores que têm sido essenciais no onze leonino, nem pareceu que o Sporting tivesse sentido muito a sua falta, tal o nível altíssimo com que se apresentou frente ao Atlético de Madrid, o que só dá ainda mais crédito e competência à equipa leonina.

Jorge Jesus alterou a estrutura posicional da sua equipa para este encontro e se o Sporting se mostrou tão bem preparado para enfrentar este adversário, pode-se dizer que deve muito às ideias e ao planeamento do seu treinador, algo que já não é de agora, tal a forma como o Sporting é capaz de se bater com grandes equipas europeias, não tendo a mesma qualidade individual, evidentemente. O Atlético praticamente não existiu em Alvalade (à excepção dos últimos minutos com o jogo mais partido e a beneficiar de espaços que nunca teve), mostrou-se sempre incapaz de perceber a forma como o Sporting estava a jogar e só a menor qualidade individual de alguns jogadores leoninos na tomada de decisão em algumas zonas de último terço, não levaram o Sporting a pelo menos ir a prolongamento e discutir a passagem à próxima eliminatória.

Todo o jogo foi muito bem preparado. O Sporting apresentou-se em 3x4x2x1 com bola e em 5x4x1 sem a mesma. Defensivamente, sempre que optava por pressionar a primeira fase de construção do Atlético, juntava sempre ou Gélson ou Bruno Fernandes a Montero, na pressão ao segundo central e pelo seu lado cego, obviamente conforme o corredor onde se encontrava a bola. Obviamente, sempre que Bruno ou Gélson subiam na pressão, o ala do seu corredor “respeitava” esse mudar de sentido de pressão e também ele subia, saíndo da linha de cinco para apertar mais à frente, ficando a equipa leonina momentaneamente organizada em 4x4x2. Quando optava por controlar em vez de pressionar, organizava-se em 5x4x1, com Bruno Fernandes e Gélson a juntarem-se a Battaglia e Bryan na zona intermédia, formando uma linha de quatro à frente da linha de 5.

Os sectores praticamente mantiveram-se quase sempre muito juntos, com a linha defensiva e intermédia muito próximas, impedindo o Atlético de entrar por dentro, entre sectores e praticamente convidando o Atlético a atacar a profundidade, onde aí, dado a maior largura da linha defensiva, se mantiveram sempre compactos, agressivos e com coberturas constantes. A cada recuperação e com o campo tão curto na zona da bola, a respectiva saída de pressão e transição ou à largura, com os alas que rapidamente saíam da linha de 5 para oferecer largura ao jogo, ou em profundidade com Montero, Gelson e Bruno Fernandes sempre disponíveis para receber de forma vertical.

O Atlético, tão capaz na complementaridade de movimentos entre os seus avançados, com um sempre a solicitar ruptura e outro a vir buscar em apoio entre linhas, quase nunca teve sucesso nesse particular, pela forma compacta e agressiva como as linhas leoninas se moviam e se juntavam rapidamente e só foi realmente perigoso, quando o jogo estava partido e em que o Sporting ao procurar o segundo golo mais com coração do que com a cabeça, já não conseguia manter essa consistência intersectorial. Aí, os espaços que o Atlético tanto gosta e procura e que foram controlados durante quase todo o jogo, apareceram, e Griezmann teve duas situações para fazer golo, que retiraria, na minha opinião, justiça aquilo que foi o jogo.

Com bola, em ataque posicional, sempre muita facilidade de contornar a primeira pressão do Atlético, fruto da proximidade e superioridade numérica entre os seus três centrais e os seus dois médios centro. Facilmente o Sporting ultrapassava a pressão colchonera e chegava com facilidade às costas dos seus dois avançados e à segunda fase de construção.

Aí, papel fundamental para Bryan Ruiz. Todo o processo ofensivo em ataque posicional passou pelos seus pés e como é um jogador tão diferente quando actua no corredor central em zonas de construção. Apesar de ter forçado muitas vezes o passe interior sem o Atlético, por estar organizado, ainda conceder esses espaços (poderemos comprovar isso no vídeo), Bryan foi o jogador capaz de dotar a equipa de maior pausa e inteligência, ligando o jogo com assertividade por fora ou por dentro quando muitas vezes o coração se sobrepunha à cabeça. A seu lado Battaglia, um médio mais capaz quando tem espaço para sair a progredir em condução do que propriamente em passe, muito forte sobretudo na transição defensiva e que com bola, oferecia a primeira linha de cobertura aos jogadores mais avançados. Bruno Fernandes e Gélson actuaram em zonas de criação, vindos de fora para dentro. Bruno, estrategicamente colocado na esquerda, por ter muita capacidade em jogar e definir em espaços curtos, mas também pelo potencial que poderia criar com a sua meia distância jogando ali, tendo capacidade de receber, orientar de frente e definir. Foi trocando por vezes com um Gélson sempre muito veloz e desconcertante e que criou inúmeros problemas ao sector defensivo dos de Simeone, pese embora a sua decisão final nem sempre tenha sido a melhor.

À largura, Ristovski e Acuna. Sempre muito disponivéis fisicamente (mais o macedónio, ainda assim, que o argentino) para subir e descer, para dar largura e profundidade ao processo ofensivo leonino e na perda, recuperar e voltar rapidamente para a linha de cinco. Foram sempre soluções à largura, ainda que o Sporting, por estar habituado a ter Bas Dost na área e os hábitos não se apagarem tão facilmente, tenha por vezes usado e abusado no cruzamento para a área, onde ter Montero, que fez um jogo muito positivo e capaz, não é o mesmo que ter Bas Dost. Foi talvez, o aspecto do jogo onde o Sporting talvez pudesse ter feito algo diferente, sobretudo pelas características do seu avançado centro. Conseguiu muitas vezes ir dentro para libertar por fora e talvez se tivesse mais paciência em zonas de último terço, no trabalhar a bola para desposicionar o Atlético defensivamente, talvez conseguisse criar ainda mais perigo, embora se perceba que do outro lado estava um Atlético que sofre muito poucos golos e para além disso, o aspecto emocional de ter que ir atrás do prejuízo na eliminatória, por vezes se tivesse sobreposto ao aspecto racional e tido muita influência na tomada de decisão dos jogadores leoninos.

O Sporting não passou, mas fez novamente um excelente jogo em competições internacionais frente a mais um adversário riquíssimo (e têm sido alguns durante estas últimas duas épocas), muito por responsabilidade e planeamento do seu treinador que, com a sua estratégia, se superiorizou tacticamente ao Atlético de Madrid. Não chegou para passar a eliminatória, mas a amostra foi claramente muito positiva. Fica o vídeo, como amostra a tudo o que fui referindo no texto.

 

 

 

Sobre José Carlos Monteiro 47 artigos
Treinador de Futebol, Uefa B, com percurso e experiência em campeonatos nacionais nos escalões de formação. Colaborador como observador e analista em equipas técnicas na Primeira Liga. Alia a paixão pelo treino e pelo jogo à analise de jogo.

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