Como vencer o City? E como trabalha uma equipa técnica no topo do futebol? O exemplo prático do génio Paulo Fonseca. Observação – Estratégia / Treino – Vitória

Dois dos membros da equipa técnica de Paulo Fonseca, Nuno Campos e Tiago Leal, estiveram ontem na Escola Superior de Desporto de Rio Maior, que tem o condão de organizar sempre formações super interessantes na área de futebol, e deram uma verdadeira lição sobre o que é o futebol nos dias de hoje, permitindo a todos os presentes perceber o caminho e a competência que é preciso percorrer e ter para se chegar aos triunfos.

Antes de irmos ao caso prático, a referência à visão portuguesa do jogo. Enquanto outro prelector de nacionalidade não portuguesa apresentou as suas observações expressas numa quantidade assinalável de dados – números! número de cruzamentos daqui, número de cruzamentos dali, a equipa técnica que conquistou a Europa com o seu jogar, apresentou ZERO dados estatísticos.

Pega em comportamentos observáveis pelo padrão do adversário, e delineia estratégias para enganar opositores. Vê o jogo, entende o jogo e prepara o jogo. Não números que são incapazes de traduzir a complexidade do jogo e fazer-nos perceber o que está a acontecer no campo. Porque lá está, tudo é tomada de decisão, e essa não é quantificável sem a observação do contexto.

Observando o City (o jogo da primeira volta), e a forma como condicionaram a construção do Shakthar, Paulo Fonseca e os seus pares perceberam dois comportamentos chave:

a) O posicionamento dos extremos dos citizens na pressão, que não ficam com laterais do Shakthar;

b) A tendência / ordem para os laterais apertarem os extremos adversários, quando estes baixam para receber a bola na ligação para o ataque

Pressionando desta forma, foi identificado o espaço nos corredores laterais, na última linha defensiva da equipa de Pep, e que era possível encontrar o homem livre no corredor central, nas costas da primeira pressão.

Identificados pontos estratégicos no Manchester City de Pep Guardiola, havia que definir estratégia para enganar uma das melhores da Europa na temporada agora finda.

A palavra que na minha opinião, marca a definição da estratégia da equipa de Paulo Fonseca, para lá do “engano” e “engodo”, é a da “Coragem”.

Vale a pena relembrar o texto do Ricardo Ferreira aqui partilhado sobre a coragem específica.

Mas, porquê “coragem”?

Porque o que delineou para enganar o todo poderoso City, comportava um risco que poucos considerariam ter. Procurar sair vivo da primeira e muito intensa pressão do City, para então chegar ao homem livre, e posteriormente lançar o ataque pelo corredor lateral no espaço vazio (e vazio porque foi criado um engodo para abrir um espaço posteriormente utilizado para matar Pep!)…

Se os laterais do Citizen saltam para pressionar na frente os alas… se os extremos do City saltam para pressionar centrais… quem ficaria livre para poder explorar posteriormente a profundidade no corredor lateral no espaço que havia sido identificado como livre? Os laterais do Shakthar!

Havia que o treinar!

Antes de ver o exercício que serviu para preparar o plano de jogo, se não identificar quem são os jogadores do Shakhtar, saiba que:

Nos exercícios abaixo, os coletes azuis simulam os comportamentos do City, e nos coletes brancos, são os laterais do Shakhtar quem estão mais profundos, e os seus extremos baixam para ajudar a encontrar o homem livre no corredor central… e trazer os laterais adversários! para garantir o tal espaço no corredor lateral na última linha adversária.

E o produto final da observação, e do treino da estratégia:

Quando estiver a ver o video do produto final, tome atenção:

  • Comportamento de Danilo (lateral direito do City) – arrastado para dentro pelo extremo do Shakhtar, e a quantidade de vezes que abriu os braços demonstrando desconforto por estar a deixar Ismaily, o lateral esquerdo da equipa de Paulo Fonseca livre nas suas costas;
  • A forma paciente como Ismaily esperou o momento em que fosse encontrado o homem livre para então iniciar movimento em direcção à baliza de Ederson.

Da observação, ao treino, até ao produto final. Nada surge porque sim, por mero acaso. Mas, antes porque há um trabalho de Paulo Fonseca e seus pares de excelência. Que não somente nos diverte enquanto amantes deste jogo, mas que aproxima e potencia as suas equipas para a vitória.

Sobre Paolo Maldini 3828 artigos
Pedro Bouças - Licenciado em Educação Física e Desporto, Criador do "Lateral Esquerdo", tendo sido como Treinador Principal, Campeão Nacional Português (2x), vencedor da Taça de Portugal (2x), e da Supertaça de Futebol Feminino, bem como participado em 2 edições da Liga dos Campeões em três anos de futebol feminino. Treinador vencedor do Galardão de Mérito José Maria Pedroto - Treinador do ano para a ANTF (Associação Nacional de Treinadores de Futebol), e nomeado para as Quinas de Ouro (Prémio da Federação Portuguesa de Futebol), como melhor Treinador português no Futebol Feminino. Experiência como Professor de Futebol no Estádio Universitário de Lisboa, palestrante em diversas Universidades de Desporto, Cursos de Treinador e entidades creditadas pelo Instituto Português do Desporto e Juventude (IPDJ). Autor do livro "Construir uma Equipa Campeã", e Co-autor do livro "O Efeito Lage", ambos da Editora PrimeBooks Analista de futebol no Canal 11 e no Jornal Record.

12 Comentários

  1. Excelente! Dos melhores post dos últimos tempos. Pela forma estruturada como está tudo explicado até um totó como eu percebe. Fez-me imaginar a alegria e satisfação de estar na pele do(s) técnico(s) e ver dar frutos, no jogo, aquilo que se idealiza durante os treinos.

    E excelente também o trabalho de PF e companhia.

  2. Fenomenal documento, gran trabajo de Paulo Fonseca y su equipo. Me gustó la forma en que, a través de lo que es en grandes rasgos su modelo de juego (salida en corto, extremos por dentro, laterales cooriendo al espacio), fueron capaces de trazar una estrategia en la cual no tienen que cambiar su idea y pueden atacar al City en las zonas que mas sufren.

    Otros equipos, cuando se enfrentan a los grandes, suelen ser mas reactivos, esperar para contraatacar, el Shakhtar no, por eso es muy acertada la palabra “coragem”.

  3. Este post também serve para aqueles críticos que continuam a teimar não perceber a qualidade do Paulo Fonseca enquanto treinador !!! Uma pena que não tenha (ainda) dado o salto para a Premier League.
    Abc

  4. Sabes que estás a fazer um bom trabalho quando vês um DD do guardiola a abrir os braços a dizer “chefe, isto não está bem”.

    Excelente post.

    • Excelente Gonçalo, é isso mesmo!

      Isto é pornográfico – Para quem gosta do lado mais estratégico do jogo. Ou para quem vê o jogo para além das cuecas e dos remates a 30m.

      Parabéns pelo post Maldini.

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  1. Fonseca Total e Europeu – Lateral Esquerdo

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