Óli&Hector na Praça Azul

A discussão entre sistemas tácticos já existe desde que se conhece o futebol. Mas ainda que vivamos já num tempo em que os treinadores sublinham a importância da dinâmica em detrimento do sistema, podemos acreditar que a vitória, desta quarta-feira, do FC Porto em Moscovo esteve intimamente ligada a um meio-campo de desenho dominador e criativo. Fazendo crença no papel e no futebol como jogo de matraquilhos, surgiriam de triângulo invertido em riste, anos depois, Hector Herrera e Óliver Torres à frente do médio-defensivo. Esse, em 2015, com Julen Lopetegui a arquitectar um dos melhores jogos que o Estádio do Dragão já viu (Porto-Bayern, 3-1), foi Casemiro. Hoje, na 3.ª jornada do Grupo D da Liga dos Campeões 2018/19, foi Danilo a ver bem de perto como o efeito box-to-box de Hector e o carrossel imaginativo de Oli se complementam. Este FC Porto de 4x2x3x1 em riste foi, durante a maior parte do jogo, o sistema que um jogo desigual para os russos pedia. Um desenho que permitiu aos dragões serem pressionantes, estarem melhor colocados para ganharem duelos, e circularem uma redonda que acabaria por bater três vezes no cordame defendido por Guilherme. Esta será a interpretação que se fará no papel do onze escolhido por Sérgio Conceição. Contudo, foi Herrera a fugir a maior parte do tempo desse desenho e a tentar juntar-se a Marega para compensar um sistema que, por vezes, ficará curto na área.

Contudo não se livraram os azuis-e-brancos dos habituais sustos de Champions. Num jogo em que a superioridade lusa era tão inequívoca como clara, dois portugueses acabaram por cometerem/estarem ligados a dois erros moscovitas que permitiram uma passagem portista em Moscovo sem exagerada turbulência. Manuel Fernandes (que permitiu a Iker Casillas a defesa de uma grande penalidade aos 10′) e Éder (que fez falta para penálti aos 25′ e foi apanhado num fora-de-jogo imaginário viu-lhe ser negado um golo importante para fazer regressar o Lokomotiv ao jogo, aos 58′) estarão também intimamente ligados a uma vitória portista que, apesar dos já referidos e habituais percalços na prova milionária, pode ser considerada justa pelo domínio que os desenhos do meio-campo e ataques azuis-e-brancos conseguiram.

No entanto, nem só de um sistema viverá um jogo que contempla tantos momentos. E a primeira-parte de FC Porto instalado no meio-campo moscovita a circular a bola livremente, gritava uma presença na área que ate só certas dinâmicas neste sistema conseguirão. Marega, extremamente útil na transição-ofensiva e na pressão à saída, peca por curto no momento de fazer esquecer que na Liga, na maior parte dos seus jogos, o FC Porto joga com dois avançados. E essa lacuna no plano fez Sérgio Conceição mandar Adrian López para aquecimento bem cedo num jogo que se sentia fácil de ganhar mas que a ligação (ou falta dela) entre meio-campo e ataque não deixavam materializar no placard – ainda que Herrera (com claro ADN de médio) tenha sido companhia quase constante para o maliano. Facto atenuado, ou completamente esquecido, por dois momentos capitais no jogo: o penálti que o olho clínico de Robert Madden (ESC) viu na área do campeão russo (Éder agarra Felipe) e que Marega converteu, e a excelente chegada à área de Hector Herrera, que ao marcar de cabeça o 2.º golo dos dragões fez lembrar as suas excelentes correrias pela área à dentro nos tempos de Julen Lopetegui (uma das coisas boas que Lopi inventou ao comando dos dragões).

E se este não fosse um jogo do FC Porto na Champions, o tempo de espera até ao final da partida seria bem doloroso para o adversário e, talvez, bem monótono para quem o seguia. Porém, este era um jogo do FC Porto na Champions e por isso os erros infantis nunca parecerão ser em demasia. Que o diga Militão, que a um excelente potencial que tudo apaga, vê cada vez mais em xeque a sua rápida adaptação ao futebol europeu. Ele, que tem tudo para se tornar num dos melhores centrais do futebol europeu, pareceu copiar de Felipe aquelas indecisões muitas vezes citadas em analogias como ‘paragens cerebrais’. Seja excesso de confiança (como no golo sofrido na Luz em que tentou estar em dois sítio ao mesmo tempo) , seja tempo a mais com a bola no pé (como na perda de bola em plena grande-área que originou o 2-1 em Moscovo) Éder Militão terá de ter mais noção de tempo, espaço e decisão para se tornar naquilo que toda a gente espera dele. Lá chegará, certamente, ainda que não o faça sem estar atento ao que de menos bom já fez desde que aterrou no Sá Carneiro.

Um golo que, ainda assim, em nada alterou a dinâmica do jogo. E com o Lokomotiv mais estendido, depois do regresso dos balneários, mais espaço ficou para a correria de Brahimi e posterior descoberta da desmarcação de Jesús, na criação de um terceiro golo importante e justiceiro. Corona, que vê constantemente o seu lugar no onze posto em causa, também ele tanto ofusca como apaga. Pelo que ficará tudo à espera de regularidade em coisas majestosas como este terceiro golo dos dragões, ou de outras como a inteligência na procura de espaços ornamentada com pormenores fantásticos que ora sentam, ora tiram adversários do caminho. Assim, o suposto 4x3x3 no papel, 4x2x3x1 no campo) lá foi suprindo a lacuna que a 1.ª parte gritou, não sem antes apanhar outro susto. Isto porque… o FC Porto jogou na Champions, lembram-se? Haverá sempre um penálti, um mau-atraso (não é Felipe?) ou um ‘frango’ que animam adversários. Um altruísmo puro e duro que, desta vez, foi anulado por um fora-de-jogo de difícil juízo, mas inexistente, que negou a Éder (sim, esse mesmo!) a oferenda de Iker e a possibilidade de fazer os russos acreditarem que era possível tirarem pontos a uma equipa muito (mas mesmo muito, melhor).

Lokomotiv-FC Porto, 1-3 (Anton Miranchuk 38′; Marega g.p. 26′, Herrera 35′ e Corona 47′)

1 Comentário

  1. “jogo que se sentia fácil de ganhar mas que a ligação (ou falta dela) entre meio-campo e ataque não deixavam materializar no placard”. Isto. Sem fluidez inteligente.

    Destacar os erros sim.. mas e salientar o chocolate de André Pereira…e o maior nervo e ritmo com velocidade e técnica de Corona.
    Mas sim, sem controlo de jogo.

Deixe uma resposta

O seu endereço de email não será publicado.


*