Sérgio e a Loba

A dualidade ofensivo/defensivo e o seu equilíbrio é, várias vezes, referida por Sérgio Conceição como sendo a base onde a sua ideologia se apoia. Indiferente ao nicho das vitórias em certos capítulos do jogo (quantas vezes não ouvimos que certa equipa perdeu, mas teve mais posse-de-bola…?), Sérgio luta, a cada jogo, para esconder os aspectos mais negativos do seu FC Porto, tentando ao mesmo tempo encontrar caminhos que levem o jogo para o último terço. E na 2.ª mão dos oitavos, frente à Roma, foi notório que a constituição de um onze que fez regressar Danilo, Militão, Otávio e Soares, tinha como objectivo claro os roubos de bola em zonas altas, mas também um maior equilíbrio quando a equipa tivesse de baixar o bloco. No FC Porto-Roma, desta quarta-feira, tudo aconteceu e tudo pareceu favorável a uma equipa à qual poderão apontar vários defeitos (e alguns deles poderiam, ontem à noite, ter atirado a equipa para fora da Champions) mas à qual terão que reconhecer competitividade, intensidade e uma ideologia que a torna, sempre, um osso duro de roer. Ou então não reconheçam, que o FC Porto, indiferente ao que alguém acha dele, andará na mesma na luta por todos os seus objectivos, vendendo bem caras as derrotas.



Assim, o Porto-Roma teve vários capítulos. E o primeiro deles seria o mais esperado e previsível de todos. Com a Loba de bloco-baixo e linha defensiva de cinco, o espaço para o qual o Lateral-Esquerdo fez referencia no seu Twitter, esteve sempre mais coberto por força da integração de mais um central em detrimento do habitual 4x3x3. Algo que não impediu o FC Porto de condicionar uma Roma em modo-espera, e soltar transições que pareceram muito mais afinadas que aquelas que (não) saíram frente ao Benfica no passado sábado. Impulsionados por um espírito que foi ganhando duelos (veja-se Marega no lance que dá o primeiro golo do jogo, na maneira como rouba e como, em segundos, integra de novo o momento ofensivo) o FC Porto encerraria com brilhantismo o tal primeiro capítulo do jogo. Isto porque, depois do golo sofrido, os giallorossi  teriam de abandonar, imperativamente, as zonas mais recuadas e dividir, pelo menos, algo de um jogo que, até ao golo do Soares, só deu FC Porto.

Linha defensiva da Roma partida em dois por força da marcação individual aos avançados do FC Porto. Marega excelente a encontrar o espaço por onde nasceu o 2-1



E daí até a um déjà-vu que já tem mais temporadas que Os Simpsons foi um instante. Roma mais subida e a trocar de pé-para-pé, encontrando alguns espaços que o FC Porto não consegue tapar, e o habitual brinde que a este nível não se pode conceder mas que os portistas insistem em continuar a dar, surgiu para dar hipóteses e crença a uma equipa que foi à Invicta para não sofrer. Éder Militão, condicionado por uma faixa direita que não lhe assenta (até quando joga a central fá-lo pelo lado esquerdo), fica imensamente vulnerável no um-para-um – facto que o mais que evitável penálti concedido confirma e que juntando à ingenuidade de Manafá no Clássico faz os adeptos azuis-e-brancos festejarem o regresso de Maxi como se fosse a contratação de Messi. E o uruguaio até viria a ser preponderante no lance que decidiu a partida, mas, até lá, ainda o FC Porto teria de oferecer novos capítulos ao jogo e sair da boca da loba. 

Depois da mudança para uma linha de quatro os espaços na defensiva romana ficaram ainda mais visíveis. Maxi, um lateral à lateral, acabaria por ser determinante na vitória portista.



E se a nova vantagem romana na eliminatória poderia fazer voltar um modo-espera que favorecia, claramente, o FC Porto, os momentos passados pela equipa de Eusebio Di Francesco no seu meio-campo ofensivo, fizeram-na acreditar e acordar para outra abordagem à partida. Vendo os espaços que se criaram quando decidiu participar também no jogo, a AS Roma ficou confiante de que poderia encontrar outro caminho para passar aos quartos que não aquele de esperar para ver o que o FC Porto poderia fazer. E apesar do maior protagonismo dos portistas – pela necessidade clara de marcar – não mais a Roma se confinou totalmente ao seu último terço defensivo. E daqui em diante, o maior protagonismo azul-e-branco contrastou com espaços de indelicadeza romana para com a estrutura defensiva do FC Porto, coisas que pouco interessariam depois de na 2.ª parte a equipa de Sérgio Conceição chegar à vantagem pelo pé do jogador que mais o merecia: Moussa Marega. Imperial a explorar o espaço entre os defesas (que mesmo com tres centrais foi aparecendo), o maliano fez o 6 em 6 e fez avançar o jogo para outro capítulo distinto.

O Dragão não se cansará de agradecer a aparição de um raro fenómeno: um Dzeko perdulário foi o oposto do matador que decidiu a 1.ª mão



Isto porque agora, para passarem a eliminatória, as duas equipas teriam que, obrigatoriamente, marcar mais um golo, e essa alínea no contracto da Champions fez, de novo, o jogo mudar de cariz. E, ainda que à primeira vista, se fosse vendo o FC Porto a atacar mais que a AS Roma, o facto de um possível golo romano poder deixar os portistas com uma montanha que provavelmente seria inultrapassável condicionou emocionalmente uma equipa que, habitualmente, comete bastantes erros não-forçados na sua saída-de-bola. E se Pepe foi imperial e brilhante no duelo (como habitualmente) as suas tentativas de sair-a-jogar foram (como sempre também) mais que disparatadas, oferecendo aos giallorossi hipóteses que, por felicidade portista, não resultaram no tal golo que, mais que provavelmente, afastaria os dragões da glória que surgiria na 2.ª metade do prolongamento. Contudo, a necessidade de Di Francesco ver a sua equipa marcar no Dragão fê -lo cometer algo que teria que ter, imperativamente, uma de duas consequências: desfazer a linha de três centrais e apostar no 4x2x3x1 tornaria a equipa bem mais perigosa a atacar, mas também abriria o tal espaço ao qual fizemos referencia no início do texto e nos dias que antecederam a partida. E, logo momentos depois da substituição de Marcano para a entrada de Cristante, a chegada à área de Brahimi (76′) confirmaria o ouro que Fernando Andrade (115′) encontraria depois de um cruzamento de… Maxi Pereira. E o que Dzeko foi desperdiçando encontrou Alex Telles, de penálti, para colocar o mal-amado mas brilhante FC Porto entre as melhores 8 equipas da Champions League. Nada mau para uma equipa que, tanta vez, é injustamente criticada pelo seu futebol vitaminado.
É que já o dissemos também, pode haver um new kid on the block com um futebol extremamente apelativo e atractivo, mas o FC Porto estará sempre, indiferente ao que acham dele, na luta pelos seus objectivos. E isso é bem mais do que foi feito por entre o período Vítor Pereira-Sérgio Conceição.

FC Porto-Roma, 3-1 (4-3 agr.) (Soares 26′, Marega 52′ e Alex Telles 117′ g.p.; De Rossi 37′ g.p.)

5 Comentários

    • Boas, GV 🙂 isto é tudo menos verdade absoluta e dá para discordar à vontade. É só a visão de um gajo com alguns defeitos e algumas virtudes. Abraço!

  1. Discordar do futebol não equivale a discordar com a opinião. Parabéns, até que enfim uma análise de pragmatismo ao FCP. Diferentes caminhos são por vezes os caminhos possíveis.

Deixe uma resposta

O seu endereço de email não será publicado.


*