Educação Física

Ah a velha faca de dois legumes que surge a cada golo sofrido, ou marcado, a cada vitória ou a cada derrota, a cada realizar de expectativa ou à decepção pela ilusão. Tão óbvia e que ainda assim nos passa ao lado – provavelmente a todos. Pois quem seria o comentador, analista, vidente que decorridos 45 minutos em Salónica adivinharia tamanho debacle do Benfica ante o PAOK?

Encarnados esticados no campo e, mais importante, a impedir a ligação da equipa de Abel, que – apesar das facetas colectivas – não conseguia progredir com mais de um, dois, passes. Um esforço colectivo só apagado e suplantado por um facto lógico que, ainda assim, nos dias de hoje parece escapar a algo que mais se assemelha a uma seita do que a algo que se possa utilizar no jogo real. Sim, o jogo tem uma vertente física. Não a tivesse, por exemplo, e ninguém olharia para a exibição do Benfica na 1.ª parte como um salto qualitativo em relação ao passado recente, até porque foi essa mesma vertente (aliada a um posicionamento inteligente a atacar que previne também a perda da posse) que permitiu que o Benfica fosse a equipa mandona (que não era há muito, muito, tempo) que o resultado final não deixa dizer.

Se há questão realmente interessante que o jogo pode provocar essa será a dos indicadores que o mesmo deu a Jesus para alterar algo antes do 1.º golo do PAOK. Nesse curto espaço de tempo foi realmente visível ao técnico uma mudança na toada do jogo e a tal quebra física de que falamos?

Sim, o jogo tem uma vertente física. Assim não fosse e como é que o Benfica perderia um jogo onde, à entrada para a segunda metade, tudo se manteve igual (à excepção de um capítulo)? Mudaram os jogadores? Mudou a estratégia? Mudou a identidade? Não. O que mudou então? Nada mais que uma desinteressante e vulgar… quebra física! E essa, mantendo um plano que até tinha dado imensos sinais de dar resultado, deixou o PAOK sair. Foi assim, simples, que o facto de a gasolina ter acabado levou a que o momento que deixava o Benfica andar por cima do jogo (organização ofensiva) passasse a ser o momento mais perigoso para o próprio Benfica.

Porque sem pernas para bloquear transições (e não só!) e sem rotinas para compensar erros (como se viu na linha defensiva) um jogo controlado e dominado passou de sonho a pesadelo. E aqui há que não esquecer o não-trabalho do Benfica e da direcção para resfriar expectativas. Todo o circo montado ajuda agora a que não se consiga ver com olhos de ver o que realmente o jogo foi: uma equipa com 5 semanas de trabalho (não há detalhe nas linhas defensiva e média e não há trabalho de movimentação no último terço) e sem metade da qualidade individual que se julga ter. Mas a propaganda tem coisas destas. Assim não fosse e o Benfica poderia ser julgado por uma primeira parte onde a competência individual e colectiva sem bola esteve muitos furos acima do passado. E esse é um indicador importantíssimo para o que aí vem. Por outro lado, continuar a não resfriar expectativas em relação aos reforços (e ao núcleo duro do plantel) nunca vai fazer nada por um Benfica que para ser realmente competitivo na Europa teria de ter reformulado o plantel bastante mais do que conseguiu até agora.

Em suma: bons indicadores em relação a um passado recente; uma derrota que dificilmente aconteceria com mais rotinas e automatismos; um Benfica sem qualidade individual para o que promete e apregoa; Jesus a conseguir que a equipa ganhe imensos duelos na 1.ª parte, o que foi chave para um domínio que mostra ser a diferença principal em relaçao passado (mas conseguirão estes mesmos jogadores manter esse ritmo e essa eficácia no duelo durante 90 minutos?)

8 Comentários

  1. Quem montou o circo e a propaganda foram os comentadeiros, numa pré-época em que só a saúde financeira de alguns clubes permitiu romper com a estagnação. Os reforços do Benfica são excelentes reforços, não há dúvida quanto a isso. Porque por outros lados também houve muito circo (reforços-que-são-reforços-à-espera-de-o-ser). Essa circunstância patética dá textos como este (https://maisfutebol.iol.pt/desce/opiniao/jorge-jesus-voltou-do-brasil-tao-diferente-que-nem-parece-o-mesmo), em que toda a gente acha muito fácil fazer um jogo de Champions nas circunstâncias actuais. Estou para ver o nível exibicional das nossas equipas em Portugal nas primeiras cinco jornadas.

  2. “A velha faca de dois LEGUMES?!” Isto é sério?….ainda pensei que era gozo, mas não parece. Não vale inventar agora que era uma piada. Que prego!

    O resto vou ler mais tarde.

  3. Falhou o treinador porque ou não recebeu da equipa técnica os indicadores sobre a condição física dos atletas, e foi ele que escolheu a equipa técnica, ou recebendo-os teimou numa estratégia em que deixou os jogadores abertos ao que aconteceu.

    Podem andar os comentadores e adeptos a bater no Grimaldo e no Weigl, mas JJ falhou onde falha sempre, no ego. JJ passa noites a sonhar com estratégias fantásticas, teorias brilhantes sobre ocupação de espaço, bola aberta ou fechada, jogadas mirabolantes,a famosa exigência prende-se com isso, JJ exige a perfeição e planeia para isso, depois bate de frente com a realidade onde tem jogadores homens e não robots, e lá está pede mais um avançado, mais um defesa, mais um, mais um, mais um…
    O SLB como treinador precisava de alguém que olhasse para o jogo e pensasse que num jogo de futebol com a quantidade astronómica de variáves tinha 3 resultados possíveis, ganhar, ganhar ou ganhar, nem que fosse com um charuto do Alfa Semedo.

    A vitória do Abel vem nos livros “Se tens menos tropas do que ele, evita temporariamente o teu assalto inicial. Há possibilidade de mais tarde conseguires atingi-lo num ponto fraco. Neste caso, anima-te, e com determinação, busca a vitória”, esta até o epistemológico Manuel Sérgio lhe explicaria, ou talvez não, imagino-o a dar bibliografia com mais densidade filosófica enquanto falam fascinados um com o outro naqueles mundos tão díspares.

    • Acho que o texto tenta explicar (na medida do possível) que, apesar do deslumbramento habitual de JJ em relação à sua capacidade, um modelo não se constrói alterando premissas que se querem nucleares. E funcionando na 1ª parte achou por bem mantê-lo. O que, em relação aos indicadores dos primeiros minutos da 2ª parte, acaba por não ser assim tão descabido. Se pensarmos em todas as vezes que já foi criticado por meter mais um defesa, ou por adaptar, ou por opções mais conservadoras, se calhar incorremos todos em alguma incoerência.

      Abel tentou atacar num período inicial mas a equipa foi empurrada para trás. E graças à competência da ideia estava também preparada para isso e para aproveitar o tal momento de fraqueza que falas.

      Em relação a JJ, com certeza que não vai ganhar os jogos todos. Mas de certeza absoluta que vai construir um modelo competente e competitivo (talvez não tanto como as expectativas que criou).

      • Brian Laudrup, concordo a 100%.

        Já começou a crucificação do treinador por ter um mau resultado, mas depois não se olha para todas as vertentes do jogo, nomeadamente a física.

        Na primeira parte o Paok não conseguia fazer 3 ou 4 passes seguidos devido à intesidade na pressão e ao posicionamento defensivo em transição.

        Quando o Taarabt “rebentou” a equipa perdeu um elemento fulcral. O Jesus apercebeu-se disso mas já não foi a tempo de mexer na equipa antes do primeiro golo.

        Também não se olha ao facto de isto ser uma eliminatória atípica jogada apenas a uma mão. O próprio Abel afirmou que a duas mãos seria extremamente difícil ganhar a este Benfica.

        Não se olha aos indicadores de que na primeira parte se a bola em vez de bater no poste batesse na “coruja” o jogo seria diferente. Se o Seferovic não penteasse a bola e cabeceasse para o golo, estariamos a discutir como o Benfica foi “mandão” na primeira parte.

        Não se olha aos indíces físicos de uma equipa com 5 semanas de trabalho sem jogos competitivos, enquanto que o Paok vem de uma senda de vitórias quer na Liga quer na Champions.

        Eu gosto deste Benfica a jogar. Não está perfeito, mas dá-me toda a confiança para atacar todas as competições.

        Saudações.

        • Pablo, a minha opinião (de curioso adepto, porque deixei as ciências do desporto nos anos 90) sobre JJ não mudou ao longo dos tempos desde a primeira passagem pelo glorioso.

          Entre os prós e os contras na minha opinião a balança cai para os contras. A gestão física nos primeiros anos foi excruciante, começar épocas com picos de forma altíssimos, não fazer a gestão dos jogadores e chegar a dezembro de rastos, os treinadores do blog que me corrijam mas penso que a metodologia no futebol mudou bastante nos últimos anos, aliás, fico contente de ter colegas encarregues da metodologia no futebol, no início da década de 90 o panorama não era tão científico e o “professor de ginástica” ainda não era muito bem visto no futebol.
          A gestão da equipa terrível e sem um plano a médio, longo prazo, havia planeamento no momento, jogavam sempre os melhores, dai o célebre lateral esquerdo que foi para o City.

          Como benfiquista não suporto o estilo e gostaria de um treinador com mais classe á frente do clube.

          Depois a exigência em relação a JJ, para quem promete o mundo e arrabaldes, arrasar, jogar o triplo, e que tem a fama de ser o treinador que mais rápido mete as equipas a jogar, cria craques (outro mito falso), etc, não posso ter a mesma tolerância que com outro treinador que recebe 1/10, quando a tolerância com os anteriores era nula.

          Dos últimos treinadores do glorioso o treinador (equipa técnica) que considero mais completo foi RV, apenas perde para JJ na comunicação, que é um exímio comunicador.

  4. Olhar o outro lado…
    Ver como consegue jogar agora este PAOK e como o fazia na chegada de Abel.
    Nem aprecio o estilo mas percebeu o “fraco” que tinha e ajustou. Mais do que o resultado, a forma como consegue junção em continuidade, e explorar transição com mais precisão. Olhando ao que tem, ainda mais mérito. Finalmente vê-se trabalho a resultar.
    Pena o Toumba vazio.

Deixe uma resposta

O seu endereço de email não será publicado.


*