O patinho assim-assim

2016 transcendeu estilo para acabar em champagne. E de lá para cá o beijo na taça transformou-se naquilo que a Selecção mais precisou ao longo do tempo. Aliada a um enorme sortido de excelentes jogadores surgiu uma mentalidade vencedora que nos permite, em 2020, regressar ao palco do crime e, desta vez, não dobrar. Uma Selecção que, mesmo tendo pela frente o actual campeão mundial, não precisou de dobrar e esperar pelo erro e frustração gaulesas, mas que também conseguiu dominar e criar. Em suma um tête-à-tête com o outrora Adamastor e causador de pesadelos que se saldou por um cruzar de espadas sem desigualdades e capaz de meter em sentido todos os que vierem a seguir (especialmente a mesma França que visitará Portugal daqui a mês).

E é antecipando esse jogo que se fará um bom exercício para o que, ainda assim, faltou neste domingo em Saint-Denis. Querer-se-á a boa relação com bola da maioria da primeira metade, sem dúvida, e com isso causar dúvidas defensivas (mas também ofensivas) na tricolor. Manter-se-à o desejo de engolir o meio-campo e aliar a recuperação para construir posse, domínio e controle (que foram evidentes na primeira meia-hora), mas pedir-se-á mais uma certa dose de atrevimento num último terço que é, com todas as virtudes e defeitos, o barómetro desta brilhante Selecção.

Foram várias as vezes que Raphael deu ajuda ao meio-campo, controlando quem aparecia naquela zona. Lateral fechou mais dentro, Félix defendeu por fora.

Com o meio-campo entregue a Bruno Fernandes e ao duplo-pivot Danilo-William, contando com a ajuda preciosa de João Félix (a fechar a ala) e Raphael Guerreiro (em organização ou pressão a fechar dentro encostando em quem aparecesse na meia-esquerda) Portugal controlou uma França que, diga-se em abono da verdade, ficou longe daquele colete-de-forças que mete os adversários no último terço para os de lá não mais deixar sair. Mas até numa 2.ª parte onde a pressão à saída dos franceses foi ficando inexistente, numa etapa complementar onde William e Bruno Fernandes já não conseguiam chegar primeiro e, mais importante, nuns 45 minutos onde a França encarou toda a sua responsabilidade com mais intensidade, brio e, até, nervo, ficou difícil a Selecção não se chegar mais a Rui Patrício – dando assim liberdade à campeã mundial para nos mostrar o que sabe fazer.

Os índices físicos fizeram mossa na etapa complementar, e Portugal apareceu desposicionado mais vezes. Bruno e William poderiam ter sido substituídos mais cedo



Felicidade para nós que a França, de momento, foi um vazio de ideias ofensivas, não retirando qualquer partido das capacidades de Griezmann (onde andaste?), Mbappé (capacidades absurdamente notáveis que parecem afectadas em jogos mais mediáticos) e Pogba (o eterno limbo de quem tem tudo para vingar). E com a capacidade de roubo de Portugal a entrar em falência cada vez mais evidente, os períodos com bola cessaram actividade para balanço assim-assim. E sendo que o espaço atrás da linha defensiva francesa (que foi obviamente subindo com a produção ofensiva) não foram castigados (Jota entrou primeiro mas Trincão dava jeito mais cedo – assim como Moutinho, Neves ou Oliveira para oxigenar o miolo) ficou-se por um empate a prestação lusa – que deixa um sabor assim-assim e um vazio para preencher na vinda de novembro.

França-Portugal, 0-0

11 Comentários

  1. 2016 transcendeu a euforia, não o estilo. O estilo continua. Jogo de cagões. Eu queria mudar para uma comédia romântica, porque Danilo-William estavam a pôr-me com sono na segunda parte. Trincão a dois minutos dos 90, para gozar com o espectador. Há vinte anos eu era um feliz espectador de futebol patriota. A geração extraordinária de hoje — que joga em todas as grandes equipas do mundo, que compõe um banco sem igual — não tem metade da genica e da magia. Só queria partilhar esta tristeza convosco, por muito injusta que possa ser (nas vossas análises e nos resultados). Abraços

    • Tens razão pá. Tambem eu suspiro pelas vitorias morais pelas geraçoes de ouro com selecionadores que não defendem. era uma verdadeira maravilha perder todos os jogos contra as franças deste mundo mas podermos dizer de peito cheio TIVEMOS MAIS BOLA E ATACAMOS MAIS! uma chatice esta coisa de ter uma selecção realista com um bom processo defensivo, sobretudo a parte de ganhar trofeus é uma seca! Agora imagina a agonia dos Italianos que jogam assim sempre… LOSERS!

      • Não sei para quem falas, “pá”. Fui muito explícito. Jogar assim, mesmo que dê para ganhar tudo, é um pouco penoso para quem viu outras gerações. Não percebo como este desabafo encontra sempre esse tipo de comentários, no precipício do argumento dos títulos, e como se eu (e outros espectadores) fôssemos uns pacóvios à margem do futebol. É um desabafo: gostava que jogássemos mais. Preferia mais passes para a frente, e menos para trás, preferia menos hesitação e mais coragem, preferia substituições mais arriscadas. Ainda bem que há contentes com isso, e que não estamos todos infelizes.

    • Realmente à 20 anos atrás até parece que se ia constantemente a fases finais e que se entrava com ambições em fases a eliminar….quantas fases finais foram mesmo na década de 90???? 1 não foi?…. A de 96?? Com a denominada geração de ouro que tantas alegrias nos deu lá fora….
      E esta geração nova de cagoes….quantas finais já vão seguidas desde 2004….e em quantas tão perto estiveram está sua denominada geração de cagoes ali tão perto das medalhas???
      Realmente Portugal era antigamente potência futebolística tão grande que se conta pelos dedos de uma mão os resultados positivos em fases finais até 2004..
      Um fantastico aplauso para os adeptos do jogamos como nunca perdemos como sempre que continuam a olhar para atual seleção como o patinho feio “que nada ganhou” com essas seleções de estrelas do passado que tudo ganharam lá fora..

  2. Parece-me que o F. Santos mexeu tarde e mal no jogo. Para lá das substituições que ficaram por fazer e estão mencionadas no texto, creio que faltou, a dada altura um avançado capaz de segurar a bola, dar apoios frontais aos médios e ganhar faltas – um pouco aquilo que fez Eder em 2016, para lá do golo. A entrada do R. Santos não fez sentido nenhum.

  3. Enorme jogo de Joao Félix. Ronaldo a atrapalhar, como de costume, e Bruno Fernandes e Bernardo a passarem ao lado do jogo, sendo que Bruno teve uma série gigante de más decisões, algumas delas quase deram golo adversário.

  4. Yup, era tudo muito mais interessante há uns anos atrás em que éramos uma boa equipa que até jogava um futebol porreiro, mas que quando enfrentava França, Alemanha, Espanha e outras de igual valia, entravamos em campo a querer saber quantos iamos levar.
    Que se lixe andarmos a discutir jogos e a joga-los olhos nos olhos com as melhores seleções do Mundo. Até temos a ousadia de lhes ganhar, vá-se lá perceber isso. Malandros!

    • Tira o chouriço do Eder da equação e diz-me onde estivemos mais perto de ganhar contra a Espanha, a Alemanha, a própria França, a Itália, o Brasil? Ontem ainda apanhámos uma França temerosa do que lhe aconteceu em 2016, mas até quando durará a poção?

  5. A grande mudança na Seleção deve-se, para mim, para além do aparecimento de novos jogadores como o Ruben Dias, o Nelson Semedo (Cancelo), Bernardo e Felix (Gonçalo Guedes, Jota), essencialmente e estruturalmente à utilização em simultaneo do Danilo e do William. Eu adoro o William. Desde que o vi pela primeira vez que lhe chamo o Patrick Vieira português, pelo estilo de jogar, embora nunca tenha pensado nele para 8. Mérito total ao selecionador – ou ao treinador do Betis, nao sei quem foi o primeiro.
    Com a presença dos dois ganhámos capacidade fisica e de ocupação de espaços para enfrentar qualquer seleção do mundo. Até o Tiago Dantas poderia jogar num meio-campo com esses dois por trás. Palavra de honra que não percebo os que pedem o Ruben Neves na seleção titular. Alem disso, com o William a 8, e com a segurança de ter o Danilo por trás, ganhámos muito na circulação e capacidade de ter bola. Não há ninguém com a qualidade dele de não perder bolas e ser consequente, só o Bernardo chega perto.
    Por acaso, na segunda parte do jogo o William perdeu mais bolas que talvez nos 5 anos anteriores mas o primeiro a desaparecer no meio-campo até foi o Bruno Fernandes. O renato Sanches deveria ter sido o primeiro a entrar, e logo aos 60 minutos. Alem de ter ajudado no meio-campo, o que libertaria um bocadinho o William, tinha levado a bola para o ultimo terço onde o Felix e o Ronaldo podiam ter feito a diferença, principalmente com o jogo ja mais partido e com a França a tentar estar mais tempo lá na frente.

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