Pizzi in the box

Um Jack-in-the-box não é coisa muito familiar para os portugueses mas, ainda assim, poderá ser o brinquedo perfeito para descrever Pizzi, um médio/extremo/segundo avançado que atinge o seu propósito dentro da box – que é como quem diz a área. Agraciado por uns, mal-amado por outros, Luís Miguel Afonso Fernandes não é um jogador de análise fácil. Pelas características – que já roçámos ao de leve na analogia com a cabeça que sai da caixa para surpreender as crianças – Pizzi encontra no golo, e nas assistências, argumentos suficientes para se debater com a facção que não se esquece de lhe apontar os momentos sem bola como principal pecado. Mas o Benfica-Standard Liège desta quinta-feira não foi propício a correrias defensivas por parte dos encarnados. Ao invés, a (ultra)organização defensiva belga pedia muita criatividade a um Benfica que chegou a roçar os 75% de posse-de-bola. Seria então o habitat ideal para Pizzi poder render à frente de Gabriel? Talvez nem tanto. Mas lá chegaremos.



É hoje comparável a uma pandemia para organizações ofensivas. Falamos da utilização da linha de cinco defesas, e de uma linha de quatro médios que – como se já não fosse suficiente – tem hoje como missão específica controlar totalmente, e ao detalhe, o espaço entre-linhas. Hoje por hoje, dez jogadores dão primazia absoluta a esse espaço, contrariando assim equipas tecnicamente mais dotadas que encontram nesse espaço as roturas perfeitas para ferirem os oponentes. Não sendo isso diferente na abordagem do Standard na Luz, com esse espaço constantemente ocupado o Benfica sentiu imensas dificuldades para criar lances de verdadeiro perigo. Contudo, a abordagem dos belgas permitiu às águias passar a maioria do jogo num momento (organização ofensiva) que lhe permite controlar perfeitamente as partidas. A dificuldade, lembramos, estava no momento de criação. Mas fazendo um compasso de espera para falar de como podia o Benfica ter derrubado mais cedo a muralha belga, não poderemos esconder que foi uma espécie de benesse para Jorge Jesus que o jogo não se revelasse tão partido e inconstante como noutras partidas desta sua 2.ª vinda ao reino da Luz.

Assim, convém também não esquecer que com o jogo nesses moldes (Benfica instalado no meio-campo ofensivo) o único real momento a ter em conta para as coisas não azedarem neste regresso dos adeptos ao estádio, seria o momento de transição ofensiva para os belgas que iriam sempre apostar nas costas da linha defensiva. E hoje, convém dizê-lo, a linha defensiva do Benfica mostrou-se irrepreensível. Se por falta de reais testes (os cinco dedos da mão sobrarão para contar as investidas do Standard) ou se por os métodos de Jesus estarem finalmente a fazer sentido para Nico e Jan, não saberemos dizer ao certo. O que é factual é que os timings e a activação na dança subir/descer foram executados sem problemas de maior e com uma fluidez a fazer lembrar o habitual nas equipas de Jesus. Com isto restava outro bico-de-obra: como desfazer a muralha que os encarnados encontravam à frente?



E para aí chegarmos convém lembrar que se não houvesse oposição, o jogo não só não seria um jogo como não seriam precisos passes horizontais para nada. O passe horizontal é um passe que existe porque há oposição num jogo de futebol. No entanto não será por isso que os passes verticais não serão precisos. E para o Benfica, nesta noite, eles foram imensamente necessários. Contudo, no momento actual de pandemia de (ultra)organizações defensivas direccionadas para parar jogo-interior, o passe vertical que pode eficazmente ser a vacina, pode muito facilmente também virar-se contra o criador. Daí surgir a questão: terá sido Pizzi o elemento mais propício para naquela zona encontrar os espaços que poderiam ferir o Standard?

Raro momento de desorganização belga permite a Diogo Gonçalves encontrar espaço interior e servir Luca

Compreende-se a escolha, porque num jogo de sentido único as características defensivas de Pizzi teriam pouco impacto. O jogo em si proporcionaria e hiperbolizaria as outras características de Pizzi. Contudo o 21 nem sempre conseguiu activar aquele sentido que encontra o buraco da agulha necessário a fazer entrar no jogo Everton, Pedrinho, Luca ou Darwin. E com esses quatro fora, haveria o Benfica de encontrar o que procurava pelas investidas interiores dos dois laterais que, juntos, foram preponderantes na criação de duas jogadas que acabaram em penálti (e que Pizzi e Luca haveriam de converter para descansar as hostes). Já por fim, a caixa abriu e lá estava Pizzi. Sempre letal dentro da área, o 21 haveria de inventar um belo remate em arco para nos fazer continuar a discussão: os jogos controlam-se com roubos de bola, posse, ou golos? Pizzi in the box é golo; Pizzi out the box pedia Taarabt mais cedo? ou os passes verticais do marroquino seriam mais arriscados para o controle total do jogo que o Benfica demonstrava? Questões que acabaram por não ser essenciais neste jogo mas que o serão na época. Fica é a certeza: não deixem a box aberta para o Luís Miguel! A não ser que gostem de golos do Benfica.

5 Comentários

  1. Em suma, como já comentei em outros posts, a maior questão a prazo que vejo no equilíbrio deste Benfica reside de facto aí; a posição 8…

  2. Juntando a este comentário as palavras de JJ, de que p Pizzi não pode jogar na linha pois é um jogador de ultimo passe, acrescentando a sua capacidade para finalizar, não seria mais benéfico para a equipa do Benfica, e mais confortável para o próprio Pizzi, avançar no terreno e jogar como – termo cunhado pelo JJ – 9.5?

    Sei que numa abordagem com 2 avançados, jogam sempre Lucca e Darwin. Mas não seria ele a alternativa natural? Não a seria já na época passada ao invés de Chiquinho, que tal como o JJ disse, sempre foi 8?

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