Benfica diz Presente!

Vivemos na era do exagero, na era onde tudo, quase tudo, é considerado uma ofensa. E, para não variar, há quem use o clima para criar ofensas plásticas que convêm a uma narrativa, a um enquadramento, a um propósito. Sabemos, portanto, do momento desequilibrado que o Benfica vive. Nos resultados sim, mas no topo da pirâmide também – que, depois de tempos inquestionáveis, abana agora também pelo cimo. Isto para trazer à baila a estéril polémica com Rafa, que antecedeu o Benfica-Arsenal desta quinta-feira. O extremo apareceu como que a desvalorizar o passado (não se lembrando da conquista das águias no Highbury Park, em 1991) e, rapidamente, se puderam ver todas as divisões que o actual Benfica atravessa. Todas elas, garanto, muito por culpa de algo que, nesta noite, não se viu.

Encarnados com linha de cinco (Lucas Veríssimo a aparecer a titular, apresentando-se em excelente plano) atraíram a profundidade de um Arsenal que raramente tirou proveito dela.



Falo-vos da incapacidade, do temor, da falta de ambição, que por norma condiciona toda a habilidade técnica que os jogadores de uma equipa grande em Portugal até costumam ter. À imagem do FC Porto, o Benfica que defrontou os gunners fez algo muito importante. Não tremeu, não cedeu, não ofereceu. E isto, para um clube de uma Liga que se vê espoliada dos seus melhores jogadores ano sim, ano sim, é, garanto, algo bastante importante. Se calhar, com esta conjuntura, não se pode exigir vitórias no Emirates (ou no caso portista em Turim) como antes havíamos visto em Highbury, ou em San Siro. Ah, os 90’s, os belos 90’s que ainda mostraram alguma da força encarnada na Europa, que é onde agora o Tribunal da Luz vai buscar a, por vezes, desmesurada exigência que, não poucas vezes, faz tremer a equipa.

Pressão adiantada do Benfica com o extremo do lado da bola a ir, e o outro a fechar. Se a bola circular até David Luiz, Everton vai, Rafa fecha.



Pareceu-vos então porventura que algum dos jogadores do Benfica que esteve em campo não sabia a história do clube? Num Benfica que se teve de adequar estrategicamente à largura do Arsenal, o 523/532 acabou por se aguentar num controle de profundidade testado imensas vezes pela equipa de Arteta ao longo da 1.ª parte. Não se via assim o gigante Benfica de ir lá à frente roubar bolas (e bem tentou, com a linha de pressão bem subida mas sem real apetência para o fazer) mas viu-se uma águia que foi atraíndo o Arsenal para os corredores laterais, fazendo os gunners esquecerem-se de Odegaard. Com isto (e com a pressão adiantada a não obter os resultados desejados) não podemos dizer que o Benfica não se expôs. Mas o que é certo é que ao final dos primeiros 45 minutos, a linha defensiva encarnada havia colocado por 7(!) vezes os avançados do Arsenal.

Arsenal sempre à procura da profundidade e sem paciência para explorar outras opções. Odegaard, na segunda imagem, mostra como o seu posicionamento poderia ter sido mais bem utilizado.



Copo meio vazio, copo meio cheio, dependendo do enquadramento. Ah se ela passa, ah se eles acertam os timings (com aquela – a única – em que Bellerín ganha as costas e deixa Aubameyang à beira do primeiro, a ser vir para assustar), a verdade é que o Benfica foi controlando as costas e ia, até, tendo alguma bola para respirar. Não a usava para arriscar, para se impôr, para se mostrar superior, porque afinal de contas não o é. E querer ser mais (já e já rápido, se fazem favor!) poderia retirar a eliminatória daquele registo que vos falo acima: não dar erros forçados, não oferecer, não atrapalhar.

Isto porque parte do planeamento para um jogo destes foca-se em retirar ao adversários os seus momentos mais importantes. E ao meter o Arsenal um jogo (quase) inteiro a ter que circular para criar, revela debilidades. Como dito, os gunners não acertaram com o timing de entrada dos avançados e caíram sete vezes em offside na 1.ª metade (facto comprovado logo à entrada da etapa complementar, quando Rowe caiu na mesma armadilha). E causar esse desconforto, enquanto não se erra, não se oferece e não se atrapalha, tem o condão de deixar uma equipa dentro do jogo. E isso, obviamente, faz com que um lance possa fazer o jogo mudar de feição. Com ou sem surpresa, uma bola parada ensaiada iria garantir um golo. Pizzi aproveitou o penálti criado por um pontapé-de-canto para ir confirmando o plano de Jesus.

Costas da defesa ganhas e bandeirola em baixo. Aconteceu uma vez durante a primeira-parte naquela que foi a melhor ocasião dos gunners.


O problema é que os minutos que antecederam esse tento do capitão já haviam demonstrado um Arsenal a entrar melhor por dentro. Mais afinado e, depois do golo sofrido, a impor um ritmo mais alto, o Arsenal acabaria mesmo por marcar (por Saka, que respondeu ao cruzamento de Cédric). Algo que pareceu descontrair os britânicos, pois o registo até ao fim nunca mais teve aquilo que lhes deu o golo (a associação num ritmo bastante elevado e difícil de parar). Facto que o Benfica aproveitou para ir congelando o jogo, como para ir aparecendo a tentar colocar a cereja em cima do plano (Rafa e Everton poderiam ter feito o 2-1, mas talvez por não conhecerem Isaías não o tenham conseguido).

1 Comentário

  1. Boa noite
    Sigo o vosso blog há algum tempo, e as vossas análises sempre me interessaram. Como mero adepto, aprendi a ver o jogo de outra forma, a entender o jogo, por assim dizer.

    No entanto, não posso concordar – principalmente como benfiquista – com a permissa de que parte este texto.
    A polémica das declarações do Rafa é tudo menos estéril. O futebol é um jogo de emoções, um jogo humano, em que a forma como se aborda o jogo, se sente o clube e se forma uma comunhão com a equipa e com os adeptos tem um papel essencial (vide o Milagre Lage).
    Que um jogador de um clube não saiba a história do mesmo é mau, que não saiba comunicar é pior, que a estrutura não lhe saiba passar nada disso, é desastroso.

    Sobre o jogo, não vi um Benfica sem medo. Vi um Benfica medíocre que o Arsenal deixou crescer, a fazer um jogo pasteloso, lento, sem ligação e cheio de erros técnicos.

    Bem sei que não temos a capacidade financeira de outrora, mas o FCP também não. E os resultados na Europa são completamente diferentes, com vantagem pronunciada para o Porto.
    A diferença? O Porto tem aquilo que o Benfica, e o Rafa, não têm. E isso não é nada insignificante…

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