Cardiff vs Liverpool – De cada qual, segundo o seu homem; a cada qual, segundo sua perseguição

O jogo entre  Cardiff e Liverpool teve a particularidade de a equipa de Gales defender com muitas referências individuais, ainda que com a preocupação de salvaguardar, dentro do possível, espaços fundamentais como a zona entre linhas e as costas da última linha defensiva. Interessante também as várias respostas dos reds ao longo do jogo.

O Cardiff optou a defender por se colocar num bloco médio-baixo,  algo aproximado ao 4x1x4x1. Os laterais muito juntos aos centrais no corredor central, para conseguirem acompanhar, quando necessário, os movimentos de recuo dos extremos do Liverpool, Salah e Mané, que andaram muito pelo meio. Na primeira parte com os reds a afunilarem o jogo pelo meio este pormenor foi muito importante

A marcação individual do Cardiff não era estanque, os jogadores não tinham propriamente um “opositor directo”, mas perseguiam quem parecia na sua zona, assim os laterais tanto seguiam o extremo, como o interior que se adiantava e ficava próximo da última linha. Gunnarson, pivô, era o jogador com maior amplitude de movimentos, pegando no adversário livre à esquerda ou à direita

Durante a 1ª parte o Liverpool não utilizou muito a largura. Os laterais, salvo excepções, permaneceram baixos e sem bola. Os extremos do Cardiff embora ficassem mais abertos do que seria normal numa defesa à zona, continuaram relativamente recuados, pois não tinham de saltar à pressão aos seus opositores directos. A ideia do Liverpool com este posicionamento, até pela abordagem ao último terço que veremos mas à frente, parecia ser aumentar o espaço entre linhas no meio para jogar aí, mas não teve o maior sucesso

Teoricamente a abordagem do Cardiff teria uma questão complicada de resolver: Firmino maioritariamente, e também Salah e Mané baixam constantemente para fazer 4×3 no corredor central, sendo ainda mais difícil controlar sem a ajuda dos extremos. Os galeses apareceram conscientes dessa possibilidade. Mesmo sendo arrastados devido à referência individual, alguém (mais Gunnarsson) tinha a preocupação de se colocar nesse espaço impedindo que um dos avançados recebesse bola. Nem sempre foi possível e quando o Liverpool fazia recuar o brasileiro a superioridade numérica era evidente porque os médios do Cardiff perseguiam Keita-Henderson-Wijnaldum e existia espaço nas costas para a bola chegar entre linhas para os jogadores da frente.

Outra forma de progressão encontrada até ao Liverpool no último terço passou pela colocação de 2 médios do mesmo lado em espaço interior, permitindo a quem estivesse no lado contrário (médio ou central) progredir por dentro.

A abordagem do Liverpool ao último terço na 1ª parte passava por realizar rupturas quando o portador da bola (geralmente quem a recebia do apoio vertical entre linhas, o 3º homem) à entrada, ou dentro dos últimos metros, tivesse espaço para realizar o passe para as costas da defesa. A ideia passava por um jogador aproximar, enquanto um colega entrava nas costas, ou um movimento de dentro para fora do 1º jogador para o 2º entrar nesse espaço (podia ser em diagonal). 

A ideia era clara e interessante dado o contexto, mas o Cardiff controlou quase sempre bem (com uma excepção). Apesar das referências individuais, a equipa da casa teve sempre como prioridade o controlo da profundidade. A última linha baixava, quando necessário, para junto da área mesmo que isso implicasse, que quem estivesse com bola entre linhas tivesse mais espaço para definir. Por outro lado, a quase ausência de

 largura dada pelo Liverpool no último terço, contribuiu para o aglomerar de jogadores galeses na zona central. Portanto, mesmo a bola entrando nas costas da linha defensiva, o timming não era o melhor ou as condições de recepção muito difíceis. 

À excepção de dois lances que veremos mais abaixo, a verdade é que com esta forma de defender o Cardiff criou dificuldades ao Liverpool, ainda que também raramente tenha saído para o contra-ataque. Com marcações individuais é complicado ter boas boas referências, além do avançado, para sair com bola da enorme pressão dos reds pós-perda

Os lances de perigo do Liverpool na 1ª parte tiveram em comum o aproveitamento do espaço entre linhas no lado direito. No primeiro, Matip aproveita o espaço que existe para conduzir, passe entre linhas (espaço ganho pelo recuo de Firmino e acompanhamento de Gunnarsson) para Salah que tem o apoio frontal de Mané. Apesar de quando Mané já estar enquadrado, os centrais do Cardiff recuarem para evitar bola nas costas, o senegalês consegue isolar Firmino. 

O segundo lance começa com novo recuo de Firmino que arrasta o médio desse lado, Ralls, e Henderson recebe bola nas suas costas para ligar com Salah, que quando se liberta do adversário directo tem boas condições para finalizar. O espaço onde o brasileiro recebeu é possível porque Arnold se adianta e leva consigo o extremo.

Na segunda parte o Liverpool apareceu com outra ideia. A bola passou a andar mais à largura com os laterais a serem mais solicitados (mesmo em zonas baixas), fazendo com que os extremos do Cardiff saíssem na pressão aumentando o espaço nas suas costas, até porque a linha defensiva continuava baixa e Wijnaldum e Keita passaram  a ir buscar a bola a zonas mais recuadas com Henderson muito adiantado. Outra consequência foi o maior espaço que principalmente Mané e Firmino tiveram mais tempo e espaço para receber e rodar entre linhas.

Outra novidade foi o posicionamento de Salah. À direita, o egípcio deu mais largura ao ataque do Liverpool. Os movimentos de arrastamento de Henderson e Firmino permitiram-lhe conduzir a bola de fora para dentro, chegando assim em melhores condições ao último terço.

Com efeito, na 2ª parte os médios do Liverpool, quando a bola chegava ao último terço, estiveram mais envolvidos. Além do posicionamento chave de Henderson a arrastar adversários, ainda em fases precoces da construção, no último terço terço Keita e Wijnaldum apareceram com mais frequência a fazerem movimentos de trás para a frente, levando também jogadores do Cardiff. Tudo isto fez com que o Liverpool tivesse mais espaço no último terço.

O primeiro golo surgiu de bola parada aos 10 minutos da 2ª parte, ainda que fosse expectável que o marcador não acabasse a zero. A partir daí o jogo foi um pouco mais dividido, sendo mais evidente a incapacidade do Cardiff jogar perante a forte pressão do Liverpool. Os ataques passaram a durar menos tempo e o segundo golo surge já nos últimos 10 minutos num penalty que começa precisamente numa recuperação de bola red

Sobre Lahm 42 artigos
De sua graça Diogo Laranjeira é treinador desde 2010 tendo passado por quase todos os escalões e níveis competitivos. Paralelamente realiza análise de jogo tentado observar tendências e novas ideias que surgem no futebol. Escreve para o Lateral Esquerdo desde 2019. Para contacto segundabola2012@gmail.com

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