Sem Faro

O Benfica-Farense pode ser contado através de várias perspectivas. E ainda que o empate final (1-1) não possa considerar nenhuma delas (pela lente dos encarnados) como positiva, fugiríamos à verdade se não salientássemos as melhorias em organização ofensiva que as águias revelaram ao longo do encontro. Porém, um clube grande carrega sempre uma enorme mochila de bitolas às costas. E para este Benfica só uma delas chega para pesar demasiado. Essa é a bitola do que foi feito na época passada, do futebol que se apresentou e da (mais importante) eficácia que o mesmo apresentou. E ainda que este Benfica-Farense mostrasse vários glimpses daquelas combinações em progressão que, inevitavelmente, terminariam com um adversário a ir buscar a bola ao fundo das redes, desta vez as melhorias redundaram num festival de desperdício que permitiu aos algarvios (ao aproveitarem uma das suas melhores armas: a bola parada) chegarem à vantagem e cumprirem o desígnio que José Mota vaticinou antes da partida: enervar a Luz.

Com muita felicidade à mistura, José Mota viu um Farense cumprir uma das suas duas melhores expectativas mesmo que, defensivamente, fosse deixando a bola muito descoberta e permitindo oportunidades atrás de oportunidades ao campeão nacional. Um Benfica que, como já dito, fluiu bem mais com bola do que em outras partidas da Liga mas que encontrou uma barreira mental, do tamanho de Ricardo Velho, para transpor. Algo que entre as combinações de Di Maria, Aursnes e Rafa, foi criando um duelo particular entre o 27 encarnado e o guardião do SC Farense. Facto que qualquer resumo em vídeo comprovará, sendo que ao invés de detalharmos aqui o milhão de ocasiões em que isso aconteceu enfatizaremos apenas que faltou Faro a Rafa (e a outros) para tornar(em) um jogo em que se acabaria por perder pontos – um daqueles onde a contestação impera no final – numa vitória sem espinhas.

Dinâmica do lado direito do Benfica com bastante espaço para progressão, combinações e triangulações que criaram uma enxurrada de oportunidades na Luz. Organização defensiva de José Mota não contemplava certamente tantas bolas descobertas, tanto espaço ao portador da bola.

Aqui, obviamente, voltaremos à história das bitolas e dos padrões, com um exemplo que não será prático nem construtivo para o Benfica mas que ilustrará como esta versão 2.0 do Benfica de Schmidt perdeu a medida e a génese – assim como o próprio Benfica enquanto clube está a passar uma fase sem referências que decidam. E, assim sendo, perguntamos, como exemplo simples, quantos golos marcaria Jonas neste jogo? E recorremos a esta questão, relembrando um dos jogadores mais eficazes que jogou de águia ao peito mas também uma era onde a eficácia era tida como certa nos jogos de um Benfica várias vezes campeão nacional nesses tempos em que o brasileiro (e outros avançados) brilhava(m). E essa é a bitola que faz os mais exagerados gritarem a Schmidt da bancada, mas que faz também os mais equilibrados desconfiarem. É que uma equipa que joga para ser campeã fá-lo mediante certos padrões. E se aqui fomos avançando alguns ao longo destas semanas, nesta sexta-feira foi o padrão da eficácia na finalização que falhou. Não chegaram assim as melhorias na organização ofensiva (mais do que suficientes para o Benfica vencer este jogo confortavelmente) quando Rafa precisou de nove(!) oportunidades para, finalmente, conseguir marcar – empatando a partida aos 71′ já depois de Cláudio Falcão ter colocado o Farense em vantagem. Melhorias que até disfarçaram a já habitual falta de intensidade (sem bola, na pressão e na reação) que ajudam a criar condições para ferir realmente o adversário – dificuldades que foram também observadas neste jogo mas que ainda assim não impediriam uma vitória que se desenharia confortavelmente fosse outro o aproveitamento das ocasiões criadas.

À semelhança do Sporting-Gil Vicente, também os forasteiros aproveitaram uma bola parada para meter em sentido um grande. Espaço à frente da linha zonal do Benfica foi determinante para o Farense ganhar a primeira bola. Com esse desvio, e outro (involuntário) a bola pôde encontrar Cláudio Falcão que, sozinho e de frente, colocou os algarvios a vencerem na Luz. De salientar que são 3 os jogadores do Farense a aproveitar o espaço entre as linhas do Benfica nesta bola parada, algo que pareceu fundamental, sendo que uma só linha pareceu deveras insuficiente para resolver o problema que o Farense criou.

Mas quando, por uma ou por várias razões, não se cumpre com as expectativas, nem as medidas da equipa estão de acordo com o padrão, mesmo que se resolva um problema… aparecem mais dois ou três. E neste caso, mesmo fluindo melhor por entre Di Maria e Aursnes, para servir a área, chegou-se a um bloqueio mental na hora de finalizar, algo que se somou ao natural acreditar de um Farense que não via castigo em passar tanto tempo sem bola e a dar bastante espaço para Angel e Fredrik encontrarem desmarcações na área, ou perto dela, por parte dos avançados do Benfica. Situações que confirmaram todas as bitolas que os jogadores do Benfica carregam na mochila quando entram em campo. Um peso que vai ficando maior à medida que as oportunidades se vão desperdiçando, à medida que a insatisfação vai ficando palpável no Tribunal e, sobretudo, à possível confirmação do maior medo que todo o jogador do Benfica (e de outro clube qualquer) carrega consigo: não estar à altura. E esse é um medo que paralisa – algo que fica comprovado nos 37(!) remates (14 deles enquadrados) e nas, pelo menos, 6 chances óbvias criadas e que só redundaram num único golo.

Dinâmica do lado direito do Benfica criou ocasiões de sobra. Cruzamentos ao segundo poste, combinações entre Di Maria e Aursnes ou incursões da direita para o meio com posterior remate, foram algumas das soluções apresentadas que criaram um caudal ofensivo mais próximo daquilo que é esperado.

Uma fase que apelidámos de , depois do empate com o Inter de Milão em casa (3-3), mas que tinha ainda as vitórias sobre os dois rivais, a vitória da Supertaça e o primeiro lugar para se contra-argumentar com essa ideia. Pois bem, três jogos volvidos (um deles também pouco conseguido para a Taça) e o Benfica não está dependente de si para garantir o 2.º lugar ao final da jornada, podendo ainda ficar a quatro pontos do 1.° (mesmo já o tendo batido em casa) e com somente um ponto a mais com que o 4.º. Um registo que, obviamente não sendo definitivo, confirma a espiral negativa de uma equipa que foi perdendo os valores, os padrões, a eficácia e, por consequência, os registos. Em suma, fica mal no registo contra bitolas que parecem ser demasiado pesadas para tanta falta de certezas, sendo que o caminho é claro (ainda que não seja simples): reencontrar-se (nem que sejam preciso revoluções no onze).

Benfica-Farense, 1-1 (Rafa 71′; Cláudio Falcão 51′)

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