Livre pool

A história dos números já toda a gente a conhece. São 15 golos em três visitas ao Estádio do Dragão, numa contenda que começou em 2018 e que teve sempre os mesmos intervenientes a liderar as equipas. Mas como nem só de números vive o futebol, e para eles tem que se arranjar explicações, convém recordar, primeiro que tudo, os bons sinais que o FC Porto havia demonstrado na edição anterior da Liga dos Campeões (curiosamente a única com Sérgio em que não defrontou os reds). E esse FC Porto equilibrado e híbrido na sua organização defensiva dava esperanças que, desta vez, o reencontro se iria desenrolar de forma diferente. Mas antes de falarmos do desequilíbrio evidenciado neste novo massacre, teremos de trazer à escrita outra das dualidades presentes sempre que se fala do FC Porto desde que Sérgio Conceição o comanda. É que é já quase tradicional falar-se das boas exibições na Champions em contraponto com algumas escorregadelas forasteiras (e não só) na Liga doméstica. E recordamos o facto porque, em boa medida, o que explica essa dualidade, poderá também explicar estes confrontos com o Liverpool que, em boa verdade, nem o chegam a ser.

Dizíamos que o FC Porto de Champions League é um FC Porto equilibrado e que não se importa, para assim se manter, de entregar a maior parte do controle ao adversário. E se olharmos para a entrada dos dragões neste jogo, rapidamente perceberemos que a ideia passava mais por jogar olhos nos olhos e meter mais unidades na frente do que propriamente conceder ao Liverpool o controle que City, Juventus, Chelsea e Atletico tiveram. Mesmo nesses jogos, lembramos, o FC Porto nunca foi uma equipa extremamente encolhida e soube sempre aproveitar saídas e escolher os momentos para pressionar alto, mas teve na sua organização defensiva a base para frustrar os oponentes. Mais em pressão contra o Chelsea e Juventus, mais em contenção contra o Atletico e City. Mas foi sempre esse o paradigma. E contra o Liverpool, se olharmos para 2018, como para 2019, o FC Porto não resiste a desequilibrar-se. E tal como nesses confrontos os reds tiveram sempre muito (mas muito mais) espaço do que todos esses adversários também tidos como tubarões europeus.

Foi sempre extremamente difícil ao FC Porto acertar com a pressão à saída do Liverpool. Mais ainda depois do primeiro golo, onde o medo de conceder espaços atrás limitou a subida da equipa. Um FC Porto que ficou sempre no limbo entre ir e entre não ir, e um Liverpool que pareceu arranjar sempre solução para encontrar superioridade. Na primeira-parte em 442, na segunda em 433, mas sempre sem conseguir prender, condicionar e magoar a organização dos reds.



E se a isso somarmos as contrariedades de última-hora (Pepe que se ressentiu da lesão e Otávio que durou pouco mais de dez minutos) que se juntaram à já conhecida ausência de Mbemba por castigo, talvez percebamos imediatamente o porquê da desorientação geral após o 0-1 (Salah 18′). É que se já é difícil encarar o Liverpool mesmo quando o resultado regista um nulo, depois de um golo sofrido a coisa complica-se de sobremaneira. Essa foi a história dessas últimas duas partidas frente aos de Klopp e haveria de, infelizmente para os portistas, acabar por ser também a desta. É que sendo uma equipa tão forte em transição, e muito competente a gerir as partidas em organização ofensiva quando se encontra em vantagem, o dilema do golo sofrido acabou por deixar o FC Porto sem soluções até final. Pressionar agora em cima era um risco muito maior – pelo espaço que se abria e pela conhecida eficácia com que o Liverpool o explora – e não pressionar era ver os ingleses trocarem à espera de uma aberta. Algo que fica patente no segundo golo, onde a tal aberta se juntou a algo muito comum também nesta partida.

A entrada dos dragões (com muita dimensão física que se foi esgotando na perda de duelos) parecia não indiciar tamanho debacle mas com a pressão a deixar de funcionar, com o Liverpool a conseguir sempre encontrar saída (ao contrário do FC Porto) e com um acumular infindável de erros individuais ficou impossível de lavar a imagem deixada nos últimos confrontos com os reds.



Se nos têm acompanhado quando falamos do FC Porto europeu, com certeza se lembram dos elogios a Sérgio Conceição no que toca aos poucos erros individuais, muito recorrentes noutras equipas do FC Porto na Liga dos Campeões. Aquele passe que saía mais curto ou mais longo, aquele atraso, aquela escorregadela, aquele frango. E hoje, a somar-se ao dilema que é enfrentar o Liverpool já em desvantagem, e aos espaços que eventualmente a equipa que defende deixa a tentar entrar no jogo, somaram-se erros individuais já quase esquecidos no Dragão. Foi Diogo Costa, foi Zaidu, foi a bola que se ganhava e se perdia logo a seguir. Foi Corona quase a assistir um adversário. Foram estes todos e mais alguns numa exibição colectiva que roçou o deprimente. Tudo reações (negativas) de um conjunto ao qual caiu a ficha aquando do 0-1 e não se soube reencontrar, nem reerguer mais. E se algo o explica bem será o que aconteceu momentos após o fogacho que levou ao golo de Taremi e que, momentaneamente acordou o Dragão.



Pressão mais acentuada, alma novamente com objectivos, e intensidade em alta nuns sólidos… dois minutos. Foi o que bastou para o Liverpool encontrar de novo as redes e trazer os dragões à mesma realidade com que se debatiam há uns anos na prova milionária. Nunca por nunca uma equipa que se quer bater com os gigantes pode errar tanto individualmente (erros não forçados, recordamos), se pode expor tanto e se pode dar ao luxo de cair mentalmente daquela forma. E o contrapressing do Liverpool não explica tudo (nem metade). É por demais evidente a diferença de meios, a diferença monetária e o dilema na altura do golo que dá a primeira desvantagem. Talvez o foco deva virar para aí, para o total esforço colectivo em não sofrer esse golo que sempre catapultou a diferença entre as duas equipas para algo… abismal. Talvez.

FC Porto-Liverpool, 1-5 (Taremi 75′; Salah 18′ e 60′, Mané 45′ e Firmino 77′ e 81′)

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