
O Brasil sempre foi um grande exportador de jogadores para a Europa. Espalhados pelo mundo inteiro, os casos de sucessos foram tantos, que jogadores brasileiros se tornaram sinal de bom futebol. Para técnicos, porém, a mesma lógica nunca funcionou. Alguns treinadores brasileiros famosos já deram entrevistas reclamando da falta de espaço no Velho Continente, ou sinalizando um possível preconceito contra técnicos sul-americanos. Mas será mesmo que os problemas são esses?
Técnicos argentinos, por exemplo, não encontram tantas dificuldades para fazerem suas carreiras na Europa. Bons e recentes exemplos, estão em Diego Simeone e Marcelo Bielsa. O primeiro, comandando o Atlético de Madrid, escreveu seu nome na história do clube. Conquistou a Europa League 2011-12 e a La Liga 2013-14, desbancando os gigantes Barcelona e Real Madrid e deixando de lado todas asapostas que diziam que não conseguiriam. O segundo assumiu o Athletic Bilbao em 2011, e fez um trabalho muito positivo com uma equipe menor. Atualmente, comanda o Olympique de Marsella, e é líder isolado da Ligue 1 com o melhor ataque da competição.
Exemplos de técnicos sul-americanos na Europa não faltam. O chileno Manuel Pellegrini, que atualmente comanda o Manchester City, teve grandes passagens pelo Villarreal e Málaga, apesar de ter vivido um mau momento no Real Madrid. O argentino Pochettino é a cabeça pensante do Tottenham.
Outro problema comum alegado na falta de sucesso de técnicos brasileiros na Europa é quanto ao idioma. É possível ver uma relação dos melhores trabalhos de técnicos argentinos serem justamente na Espanha, afinal, compartilham o mesmo idioma. Mas Pochettino, por exemplo, trabalha na Inglaterra e quando estava no comando do Southampton, não dava uma única entrevista coletiva sem o auxílio de um interprete. O idioma não é uma barreira tão difícil assim de ser superada.
A questão, talvez, esteja muito mais na maneira como os técnicos brasileiros encaram suas funções do que um possível preconceito ou barreiras linguísticas. No Brasil, o futebol é um esporte completamente passional, e isso se estende aos técnicos de futebol. As relações que nutrem com seus atletas no vestiário são muito mais íntimas, e até mesmo fogem de um âmbito estritamente profissional. É diferente da maneira como seus compatriotas sul-americanos regem seus times.
Historicamente, o Brasil é reconhecido pela técnica e habilidade de seus jogadores. A aplicação tática sempre esteve em segundo plano. Na Argentina, conquistas históricas como a Copa do Mundo de 1986, estão muito ligadas a disposição e aplicação tática de seus jogadores. Essa diferença na natureza do futebol brasileiro exige que seus técnicos também sejam diferentes. E isso se torna uma muleta. Se torna uma desculpa.
O treinador brasileiro muitas vezes parece ter dificuldade em se adaptar a outras culturas. Foi claramente o caso de Vanderlei Luxemburgo, no Real Madrid, e Felipão, no Chelsea. Não aconteceu uma procura por parte deles em entender como a dinâmica dos clubes funcionava, seja no vestiário ou nos treinamentos. São poucos os treinadores brasileiros que se atualizam e estudam o futebol. Ficam presos em suas ideias de futebol passional e táticas ultrapassadas.
Mano Menezes, em 2009, no comando do Corinthians, trouxe algo de diferente ao futebol brasileiro: a equipe jogava de maneira mais compacta, com os setores mais próximos, se ajudando no ataque e voltando para defender. Na mídia brasileira, se berrou que o futebol do Corinthians era “o mais Europeu do Brasil”, e apostavam no time como favorito nas competições em que entrou. Tudo isso por um estilo de futebol que chegou ao Brasil com anos e anos de defasagem.
No Brasil, as equipes são comandadas por treinadores ultrapassados, que se recusam veementemente a se atualizarem. Qualquer um que traga algo minimamente novo, que estude nem que seja um pouco, domina as competições nacionais e sul-americanas, como foi o caso de Tite, com o Corinthians, e é o caso atualmente de Marcelo Oliveira, no Cruzeiro. É de se notar que Marcelo Oliveira e Mano Menezes são de uma safra nova de técnicos brasileiros. Tite, apesar de mais antigo, é um dos poucos técnicos que não se recusou a se atualizar e se reinventou dentro do futebol brasileiro.
Essa visão de futebol que se importa com a aplicação tática de seus jogadores, chegou ao Brasil apenas recentemente. Os futuros novos técnicos brasileiros serão os primeiros que entrarão no esporte “nascidos” dentro dessa percepção. É o caso de Sylvinho e Antônio Carlos Zago.
Sylvinho, caso quisesse, já poderia ser técnico em equipes de médio porte no Brasil. Mas o ex-jogador, que teve sua carreira quase que inteira na Europa, procurou ser auxiliar técnico no Brasil primeiro, entender a rotina e se preparar antes de assumir o comando de alguma equipe. Recentemente, anunciou que será auxiliar técnico de Roberto Mancini, na Internazionale. Já o ex-zagueiro Zago, como auxiliar técnico, acompanhou a Roma na temporada passada, e atualmente exerce a mesma função no Shakhtar Donetsk.
Se darão certo, é outra história. Mas são dois exemplos que enxergam o atraso brasileiro taticamente, e estão estudando futebol para um dia assumirem suas posições como treinadores.
por André Medeiros
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