Os mitos do futebol caem aos pés dos predestinados

Apesar do futebol já ser jogado há bem mais de uma centena de anos, existem mitos e ideias antigas que ainda prevalecem nos dias de hoje. Seja em relação a posições e papéis de um jogador no campo, sobre o estilo de jogo associado a uma certa nacionalidade ou continente ou, indo aos extremos, até em relação à cor da pele existem esteriótipos que influenciam a análise de muita gente. Por tudo isto, durante muitos anos as análises ao futebol foram muito simples e subjetivas, tendo em conta aquilo que muita gente ouvia dos mais velhos: os médios defensivos devem ser todos fortes fisicamente, entroncados e jogar o mais simples possível, atirando a bola para a bancada caso seja necessário. Os jogadores nórdicos são todos altos, toscos e fortes, enquanto os jogadores de leste são agressivos, com pouco temperamento mas com muita intensidade, bons para os jogos grandes. Já partindo para o pior destas análises, continuam a haver relatos de guarda-redes de raça negra que não têm as oportunidades que merecem porque, tendo em conta estes mitos centenários, “são todos fracos” (procurem as declarações de Onana, guarda-redes do Ajax, sobre o assunto e podemos refletir um pouco).

O bom do futebol é que quem manda é a bola, e quem toca nela. Mais antigos que estes mitos, só mesmo os diferentes jogadores que os foram não só rejeitando, como desmentindo com toda a classe e qualidade. Beckenbauer partia desde a defesa com uma qualidade técnica que fazia invejar muitos extremos de equipas grandes. Maradona foi para Italia, um campeonato duríssimo em que os “brinca na areia” não vingavam, e tornou um Nápoles mediano numa equipa memorável e que entrou na história da Serie A. Victor Valdes, um mal amado do final da década de 2000, acabou por ajudar a revolucionar a posição de guarda-redes e as suas funções no momento ofensivo, muito por influencia de Guardiola. Mais recentemente, Leo Messi mostrou que o tamanho pouco importa quando a qualidade é superlativa, e vingou contra equipas e seleções de todos os tipos e feitios, mostrando ser um dos melhores de sempre do futebol. Poderia enumerar muitíssimos jogadores que ao longo dos anos foram quebrando barreiras e mitos relacionados com o jogo.

Olhando para o jogo atual, e para a evolução do futebol, há algo muito óbvio que podemos concluir: os jogadores que servem para apenas um momento do jogo, ou para ações muitos específicas do jogo, estão a ter cada vez mais dificuldades a chegar ao mais alto nível. Seja um guarda-redes, um central, um médio ou um avançado, todos têm que ter qualidade com bola, todos têm que saber defender, todos têm que pensar o jogo, e quem pensar melhor e mais rápido irá sempre ter mais sucesso. A posição de médio defensivo é talvez uma das mais exigentes hoje em dia, e uma das que mais evoluiu ao longo dos anos. Vimos em Sergio Busquets o médio defensivo moderno, que não só era tremendo defensivamente, muito forte na pressão e na recuperação após a perda de bola, mas também trazia calma e critério com bola, algo diferente do que acontecia uns anos antes naquela posição (ainda nos lembramos de ver jogadores muito profissionais mas que, com todo o respeito, eram menos habilidosos, como Gravesen no Real Madrid, Gattuso no Milan, Roy Keane no United etc). Ora, desde a ascensão de Busquets, e mais uma vez com uma influência incrível do Barcelona de Pep Guardiola, que vemos o próximo passo na posição de médio defensivo. Saber defender, saber equilibrar, saber pressionar após a perda… E saber desequilibrar com bola. É para este último passo que caminhamos. Com as equipas cada vez mais bem organizadas defensivamente, são necessários cada vez mais recursos técnicos para conseguir desbloquear estas defesas, e isto parte de todas as posições no campo. Um pouco avançado no tempo, existe um jogador que sempre que está em campo nos mostra o caminho para a posição 6: Thiago Alcântara. (video retirado da página “Gegenpressing91”)

O craque espanhol campeão da Europa pelo Bayern, agora no Liverpool, mostra que não é preciso ser um armário nem um monstro fisicamente para saber ser um dos, se não o, melhor médio defensivo do mundo. Muito forte com bola, como é sabido, partilha também de características inatas para parar contra-ataques, posicionar-se no sítio certo e recuperar bolas, sempre pronto a ser ele a iniciar o ataque da sua equipa. Em todos os momentos, Thiago é um craque e uma prova de que os mitos de antigamente estão constantemente em desuso, mesmo que se continuem a ouvir por este mundo fora. Cabe-nos aproveitar, como sempre, a qualidade dos craques que são predestinados a eliminar os mitos do passado.

(deixamos os melhores momentos de Thiago frente ao Manchester United, numa exibição enorme do médio espanhol)

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Sobre RobertPires 84 artigos
Rodrigo Carvalho. 26 anos, treinador adjunto-analista nos San Diego Loyal, EUA. @rodrigoccc97 no Twitter.

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