Gosto muito de você, Rubenzinho

É certo e sabido que treinadores que ganham são os mais gostáveis. De repente, tudo lhes parece assentar bem e entram directamente para o top dos mais em tudo a que possam concorrer. Sejam os mais bem vestidos, os mais estilosos, os mais sexys, os treinadores que ganham, desconfio, podem parecer um eremita que, ainda assim, seriam incondicionalmente amados, compreendidos, respeitados. Claro que este indondicionalmente se desenha a itálico, não vá o c%$&/# do treinador perder. Mas hey, até lá, treinador que ganha, ama-se. E isto é importante, porquê? Porque quando se tentam exprimir ideias sobre um treinador que ganha (e sobre a sua equipa, já que ela por arrasto também ganha) esse magnetismo, essa vibração do treinador vencedor pode toldar as mentes de quem escreve sobre ele. De repente, lembro, quase tudo é celestial. Mas também, meus caros, é tudo menos sorte, é tudo menos por acaso. E o percurso de Rúben Amorim, nova coqueluche do futebol luso, prova-o.

E prova-o até porque as reações iniciais começam a ir buscar as tão velhas hipóteses, as tão gastas condições, as tão usadas possibilidades. E se…? Perguntam. E se houvesse jogos europeus? E se houvesse adeptos no estádio? E se – questionaram-se Sérgio Conceição e Jorge Jesus -… e se jogássemos no mesmo sistema do que eles?

Ó não, outro 343!

Ainda é pior, respondeu Rúben Amorim! Esta é a história de mais um célebre encaixe num 343/523 em Portugal. Algo que afinal parece que veio mas não vai ficar. Isto porque das duas vezes que alguém ousou confrontar o Sporting no seu desenho, o mesmo Sporting respondeu a outro se, por duas vezes, com enorme distinção. É que uma das dúvidas que se punha aos leõezinhos de Rúben era a de terem que bater os adversários directos para poderem entrar nas contas mentais dos comentadores, analistas, araútos e profetas da nossa praça. O único problema é que a mente que faz essas questões, e que cria esses ses, vai continuar a querer achá-los ad infinitum. Por isso é provável que, para essas mentes lineares, o Sporting ainda vá ter de passar por uma catrafada de testes como agora sem mãos, jogar de pés atados, ou a cumprir o ramadão para as satisfazer. Mas a verdade é que a futurologia não é um ramo de futuro porque – mesmo sendo apelativa por só haver dois resultados possíveis (ou ganham ou não ganham) – a mente que se deixa ir pelas previsões fá-lo na maioria das vezes ou por desejo, ou por medo. E eu desconfio que Rúben transcendeu essas duas. Ao invés de desejar, ao invés de querer ganhar por ter medo de perder, ele sabe que vai ganhar. Diria mais, ele tem a certeza inabalável que vai ganhar! Verdade? Mentira? Só em maio se saberá, mas essa sua crença está a mudar tudo em seu redor.



E isso faz diferença, porquê? Faz imensa, respondo, porque muda o ambiente. E para explicar isto vamos recorrer a um episódio dos Simpsons (do qual não me lembro nem de qual temporada, nem de qual episódio da mesma) onde oSanta’s Little Helper, famoso canídeo que pertence à família, é emprestado para o lar onde vive o Avô Simpson. E ao princípio a alegria é geral, pois a energia do feliz amigo de quatro patas faz a diferença no ambiente envelhecido daquela care home. Mas pouco rejubilaram os velhotes, visto que a próxima cena onde o pobre do cão entra já está ele em frente à TV, acabrunhado, coberto de mantas e com óculos fundo-de-garrafa. E isto é o que acontece quando a energia de um sítio é mais forte do que a nossa. E, coberto de mágoas, o Alvalade XXI fez isto a Jorge Jesus, a Keizer, a Silas – só para falar nos mais recentes. Mas de quando em vez há um new kid on the block que sabe a fórmula para tudo isso transcender. O truque, dir-nos-á, é o foco. Pode focar-se nas mentiras, nas ilusões, no negativismo e perecer em relação à história, à energia dominante no sítio, mas Rúben escolheu focar-se no que traz com ele. Não só a sede de vencer, mas a certeza de vencer. E isto leva-nos a uma conversa sobre fé.

Faith is the substance of things hoped for, the evidence of things not seen

Bem sei, já vai longa a conversa e de tácticas, sistemas e estratégias… népia. Mas eu explico o porquê – recorrendo até ao jogo. É que se o modelo, a táctica, o sistema, fosse realmente o mais importante, ontem no Alvalade XXI teríamos assistido a um redondo e enfadonho empate a zeros. Um nil-nil de muita luta, de muito encaixe, de muita bola pelo ar, onde o sistema seria a base para anular o adversário (anulando-se a si próprio também). Mas dentro de um modelo, joga a identidade, a mente, a emoção e o físico de um jogador. Daí eu poder, por exemplo, defender os pontapés-de-canto da mesma maneira que Sacchi e não obter o mesmo resultado, percebem? Dentro do modelo, do sistema, percebe-se a turbulência ou fluidez de um colectivo criado por onze individualidades. E o facto de os mesmos desenharem o mesmo sistema até nos ajuda a perceber muito bem que o que as equipas pensam de si próprias tem, e muita, importância no desfecho dos jogos.



E o que é que o Benfica pensa de si próprio? Não muito, diria, depois de ver a enésima sucessão de erros técnicos e de decisão que comprometeram uma exibição defensiva que até foi bastante segura. E se Otamendi, Vertonghen, com Jardel primeiro e Weigl depois, estiveram em excelente plano varrendo a criação do Sporting entrelinhas, tudo o que os encarnados foram fazendo com bola roçou a depressão. E de todas as figuras que foram falhando aqui, ali e além, houve uma que mais captou a atenção e que explica bem a fluidez, ou falta dela, de um corpo com ou sem dúvidas. Falamos de Darwin Nuñez que, neste momento, é incapaz de tomar um decisão com sentido sempre que a bola tem a infelicidade de lhe vir parar aos pés. Um efeito que se vai estendendo pela equipa e contagia Rafa, Pizzi, Grimaldo e o vira tudo para o outro lado Gabriel. Assim, amigos, o sistema pode ser o mesmo e a execução pode ser diferente.

Não que, ainda assim, o Sporting tenha estado muito acima, até porque este encaixe já nos mostrou que pode ser especialmente duro para o olho humano. Eles são centenas de duelos, num jogo de espelhos que requereria outra finesse, outro desembaraçar das zonas de pressão, outro atrair e fixar. Mas a escala seria tão alta que teríamos de chamar uma equipa de outra galáxia para ir ao Alvalade XXI e meter o Sporting num 541 encostado à sua área. Isto porque os grandes em Portugal não têm assim uma superioridade notória uns sobre os outros que lhes permita a confiança para circular sobre pressão individual aguerrida, acalmarem-na e sujeitaram-na a fechar ou a ver a bola deslizar sobre os seus espaços. E assim sendo a coisa torna-se uma batalha de repelões mas que teve o condão de mostrar quem mais acredita, quem mais confia, quem mais certeza tem. Que é o mesmo de dizer que mostrou o que Rúben mais sabe, o que não é fé, é mesmo certeza e saber que, por exemplo, não só contagiaram os jogadores (que acreditam até ao fim, com provas dadas disso mesmo) como também por muitos dos adeptos – que podem agora ser lidos nas redes sociais à espera da próxima final, ao invés de estarem já focados em maio ou a vilipendiarem o maior rival pelo facto de lhe terem roubado três simples pontos. É que o desejo de festejar com a equipa depois de um longo hiato é bem maior do que o de fazer futurologia. Pois como Rúben avisa, o Marítimo é o próximo obstáculo para esse desiderato, numa lição em que o jovem técnico faria uma excelente participação num qualquer episódio de Querido, mudei a casa! E não é que mudou mesmo? Resta saber se será a casa vencedora, porque até lá, com uma volta inteira para disputar, Sérgio e Jorge (ainda que sem o mesmo espaço para treinos aquisitivos) também podem mudar as suas. O que parece ser certo, e sem ses, é que este Sporting, e o seu treinador, lá estarão – muito pela certeza que Amorim trouxe e muito porque essa tudo contagiou à sua volta.

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5 Comentários

  1. No essencial não há grande coisa a falar do jogo para além do texto.

    Foi um jogo muito fraco que demonstrou as fragilidades de quase todos os treinadores portugueses (mais de 90 por cento dos que eu conheço, diria): óptimos a bloquear o adversário e péssimos ou perfeitamente banais a atacá-lo com bola.

    Não concordo muito com a ideia do golo ter surgido pela frescura mental, isto é pura especulação do irmão do Michael Laudrup (eu também podia dizer que as dificuldades contextuais do Benfica atiraram a equipa para baixo ou o contrário, se tivesse ganho, por via da superação e bla bla bla), aquilo foi mesmo um erro da equipa do Benfica e de alguns jogadores (Weigl, N. Tavares, entre outros). Naquela altura do jogo quem estava melhor era o Benfica – o Sporting teve largos períodos que nem passava do meio-campo com bola e o Benfica nem por isso – mas sem conseguir nada lá à frente. Más decisões, recepções, maus passes, maus cruzamentos, pouca gente na frente contra uma floresta de pernas (sim porque o esquema defensivo do Sporting não é muito mais do que isto).

    Em todo o jogo, o Benfica teve pelo menos duas transições em superioridade, uma do Rafa logo no início e outra do Darwin no início da segunda parte… Que nem sequer chegaram à área adversária, quanto mais finalizar.

    Só me parece que é desonesto, mas mesmo muito desonesto, falar deste e de outros jogos, sem praticamente nenhuma referência ao contexto de covid em metade do plantel e jogos seguidos sem possibilidade de treinar. E quando se treina faz-se em grupos separados, pelo menos até há poucos dias. Fala-se aqui de JJ mas quem esteve no jogo foi o João-que-de-Deus-nada-tem. Isto não é mera retórica, é concretamente factual.

    Cada vez que começam os jogos, especialmente depois do Dragão, eu não faço ideia do que esperar desta equipa. Julgo até que está aqui um tema interessante de abordagem sobre o treino e o contexto das equipas sem ser as banalidades que têm publicado ultimamente.

    • Boa sugestão de artigo Pelé.

      Qual a importância da falta de tempo para treinar, para afinar processos entre aqueles 14-15 jogadores que são os que mais jogam?

      O Benfica, perdeu metade da defesa titular – Ruben e Almeida – no fechar do mercado de transferências, e apartir desse momento são vieram os jogos de 3 em 3 dias, sem tempo para afinar os processos sem ser em jogo.

      Agora está totalmente condicionado no treino devido ao surto Covid que assolou jogadores e treinadores.

      Quão diferente seria Darwin com treinos implementados pelo JJ para melhorar a sua decisão no momento de desmarcação? Veriamos tantas vezes como hoje vemos, Darwin a ganhar profundidade para cima do jogador que transporta a bola, ou veríamo-lo mais vezes a ganhar ainda mais largura abrindo espaço para si e para quem leva a bola, criando duvidas no defesa?

      Falo no Darwin, mas poderia falar no Tavares, no Gilberto entre outros jogadores com lacunas evidentes. Ou poderia recordar as palavras de Enzo Perez “JJ ensinou-me a ser 8. A não correr a todas as bolas, a gerir os meus ritmos.”. Teríamos uma versão melhor e com menos erros da Taarabt?

      Afinal, o treino não é uma das maiores valencias do JJ??

      Brian, perferias ter um plantel fechado a 15 de Julho* ou ter muitas certezas que vais ganhar?

      *sim, eu sei que é utopia. Mss é só para reforçar um ideal (esta data) VS perderes os melhores a 1 de Setembro.

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