O que é que eu quero ensinar?


O modelo de jogo, é uma ferramenta utilizada pela maioria das equipas técnicas. Este parte de uma ideia de jogo e permite, através de princípios de interação, estabelecer um referencial coletivo.

É influenciado por vários fatores como o contexto, o plantel, o clube…, mas sempre partindo da ideia de jogo do treinador. Todos estes fatores modificam a intenção prévia e fazem emergir um modelo de jogo único. Único porque nunca está concluído. Está em constante evolução com avanços e retrocessos e porque a infinidade de fatores que o influenciam fazem com que não exista nenhum igual.

Percebemos, por isso, que cada equipa tem um modelo de jogo diferente e que cada jogador tem características desiguais. Isto exige, portanto, que durante o processo de aquisição, o jogador e o modelo se adaptem mutuamente um ao outro.

Neste texto, o principal foco será a forma como um jogador tem que ser preparado para encaixar em diferentes tipos de modelos.

O futebol de hoje em dia faz com que um jogador conheça diferentes realidades. Tanto a nível futebolístico como a nível social, e é fundamental que o jogador tenha capacidade de estar constantemente em aprendizagem, e por muito paradoxo que possa parecer, de possuir capacidade para desaprender.

” No futebol não deves estar somente disponível para aprender, deves estar disponível também para desaprender” –

Johan Cruyff

Como pode um jogador formado no Barcelona, preparado de uma forma específica durante toda a sua formação, chegar a um contexto sénior e acabar, por exemplo, a jogar num contexto Burnley, onde tudo é diferente?

Evidentemente que existem vários conceitos que são transversais. Porém esses mesmos já estão incutidos inconscientemente no jogador. Seria como perguntar a Messi porque fintou daquela forma. A resposta seria o inconsciente, pois essa é a forma que o nosso cérebro tem de criar hábitos e dessa maneira dar repostas mais rápidas!!!!!! Num contexto sénior, o papel do treinador não é de ensinar a um qualquer Messi sobre como fintar, mas sim como conseguir criar uma reposta coletiva que permita fazer emergir uma organização, naquilo que é o caos inerente ao jogo de futebol.

“A relação coordenada e organizada entre os jogadores faz emergir alguma coisa, que está para além da soma das partes’’

Professor Vítor Frade 2010.

É portanto fundamental que durante a formação, o jogador seja formado para aprender, pensar…

Esse deve ser o macro objetivo no futebol de formação: criar jogadores independentes do treinador capazes de se auto-organizar tanto dentro de campo como fora dele. Para chegar a essa finalidade é fundamental implementar vários princípios metodológicos.

Segundo Paco Seirul.lo, a linguagem no mundo do futebol foi concebida a partir de uma ótica militar. O mesmo dá vários exemplos de possíveis mudanças. Tais como chamar o adversário de ‘’a outra equipa’’ e os seus jogadores de ‘’colegas de outra equipa’’. Trocar, treinar e jogar por praticar… O problema é que a terminologia atual do futebol promove o medo e a agressividade. O medo de perder a bola, de fintar, de sofrer um golo. Esta possível mudança de linguagem permitirá algo que é fulcral na formação de um jogador: a bola como centro da aprendizagem. A bola tem de estar presente em todos os exercícios! Não me refiro a bola como um “objeto”, visto que exercícios com bola podem ser diferentes de exercícios em situação com bola. Importante realçar igualmente que eles não devem otimizar a relação do jogador com bola (que dura em média entre 1 minuto e 2 por jogo) mas sim o comportamento do jogador em relação a bola (90 minutos por jogo).

Porque é que a bola é importante?

“Só o movimento intencional é educativo”

– Frade,1985 p.7

Logo, a presença da bola na formação é indiscutível. Afinal de contas quem gosta de jogar sem a bola?

Estes mesmos exercícios tem que ser considerado como um meio para a descoberta guiada.

“Eu chamo-lhe descoberta guiada, ou seja, eles descobrem segundo as minhas pistas. Construo situações de treino para os levar a um determinado caminho”

Mourinho (Periodização Tática, Tobar)

É fundamental não dar a respostas definitivas aos jogadores. Um exercício que necessite de um constante feedback do treinador, para chegar a sua finalidade, não é um exercício otimizado. Os jogadores têm de descobrir por eles próprios as respostas, que muitas vezes só eles podem encontrar – O exercício deve guiá-los ao objetivo.

Na formação, o modelo de jogo tem uma importância mínima porque os resultados não importam ou pouco importam. O importante é formar jogadores ou melhor HOMENS. “Qual é o tipo de homem que eu quero que nasça do treino que eu vou dar “- Prof Manuel Sérgio.

Por essa razão, o feedback de um treinador de formação tem sobretudo de atuar na fase de autoavaliação na tomada de decisão do jogador, isto é, no instante pós execução. Novamente, o treinador não deve dar a reposta, mas sim a pergunta. Por exemplo, um jogador encontra-se em posição favorável para ir no 1vs1 e decide jogar para trás. O treinador, ou melhor o “formador”, invés de exigir do jogador que arrisque o 1vs1, deverá pergunta-lhe “porque decidiste dessa forma?”.

Todos estes princípios metodológicos procuram acima de tudo, criar condições para que o jogador se possa auto-formar o máximo possível. Hoje em dia a formação é cada vez mais importante, tendo em conta que os miúdos jogam cada vez menos tempo, e por isso a intervenção adulta torna-se fundamental. Desde que bem fundamentada, sem coarctar possibilidades de desenvolvimento.

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