
(Nota: este post nasce originalmente de um trabalho por mim desenvolvido no Master em Big Data Aplicado ao Futebol. O objectivo desta análise é juntar o habitual trabalho qualitativo aqui desenvolvido (ainda que um pouco menos detalhado desta vez) e alguma análise quantitativa, sendo a amostra, como verão, bastante pequena. Tendo no fim a tarefa sempre ingrata de retirar conclusões e sugerir aspectos que possam melhorar a performance. No final, 3 videos em anexo ajudam a visualizar o que se pretende enunciar)
Contextualização
O Arsenal recebeu o Aston Villa na época 21/22. Os gunners procuram ter bola e um bom domínio do jogo posicional, nomeadamente na 1ª fase de construção, tendo várias soluções para chegar ao último terço.
Neste jogo a estrutura utilizada foi 442 assimétrico. À direita o avançado Lacazette baixava no half space para ser apoio frontal do lateral-médio e extremo do seu lado. Saka, o extremo foi várias vezes a referência de largura máxima e o lateral Tommiyaso ocupou zonas mais dentro, seja à largura ou até no half space. O outro avançado Aubameyang, fixava-se mais em posições centrais podendo ocupar o espaço livre deixado pelo recuo de Lacazette ou arrastando a linha defensiva adversária (ocasionalmente podia aparecer no half space esquerdo a servir de apoio frontal) e à esquerda o ala Smith Rowe jogava ligeiramente dentro (ainda que aberto e a receber de frente) e a largura era dada normalmente pelo lateral Nuno Tavares. Existindo portanto, uma maior aglomeração à direita foi possível ver que o objectivo passava por usar este factor para fazer 2×1 no lado contrário com a subida de Tavares.
Os dois médios centro, Partey e Lokonga serviam de apoio por trás à circulação, ainda que com liberdade para em movimentos de trás para a frente aparecerem em zonas mais adiantadas, nomeadamente entre linhas.
Esta distribuição pareceu encaixar no 5x3x2 do Aston Villa. Tendo o adversário 3 jogadores no “meio-campo”, fazer a bola rodar da direita para a esquerda (uma rota que pareceu estar especialmente trabalhada) e provocar o 2×1 frente ao ala adversário com Smith Rowe e Nuno Tavares pareceu um objectivo
O Arsenal tem um jogo muito baseado em combinações e procura de aproveitamento dos corredores laterais.
Métrica
Contra bloco baixo quantas vezes os jogadores do Arsenal conseguiram ficar somente com a linha defensiva pela frente.
Objectivo da métrica
Sabendo que frente a um bloco baixo, nomeadamente a linha defensiva de 5, como o Aston Villa apresentou na 1ª parte durante boa parte do tempo, a maioria dos treinadores considera que ultrapassar a linha média, ficando o portador da bola somente com os defesas pela frente, ajuda à progressão e criação de perigo.
Esta métrica pretende contabilizar quantas vezes o Arsenal durante a primeira conseguiu o comportamento descrito no parágrafo anterior, em ataque posicional, retirando daí situações vantajosas, e posteriormente perceber quais as dinâmicas que tiveram sucesso e insucesso na progressão da equipa.
Para efeitos de contagem, neste estudo contabilizamos ataque posicional como um ataque com 4 ou mais passes
Descrição específica de cada uma das variáveis a registar
Numa primeira fase contabilizar o número de ataques posicionais que chegaram ao último terço. E desses quais conseguiram ter somente a linha defensiva pela frente
Caracterização da amostra
13 lances em que o Arsenal está em ataque posicional e chega ao último terço – 1ª parte, 45 minutos
Jogo: Arsenal vs Aston Villa
Competição: Premier League
Resultados obtidos
Em 13 ataques nas circunstâncias referidas, 5 conseguiram enquadrar um jogador com a baliza adversária somente com a linha defensiva pela frente, ou seja, em 38,6% das oportunidades
É notório que o Arsenal podia ter aproveitado melhor os ataques no último terço. Veremos os comportamentos que tiveram sucesso e insucesso na progressão da equipa
Quando existiu sucesso
– Após a bola chegar ao último terço pela primeira vez, por um dos corredores laterais, fazer bola chegar ao lado contrário e procurar os centrais. Os avançados do Aston Villa saltaram na pressão, assim como médios e alas criando espaço interior para combinar e receber entre linhas (lembrar que neste capítulo Arsenal tem 2 avançados capazes de serem apoios frontais).
Posse mais longa. 2 situações – 1 sucesso – 1 insucesso. Taxa eficácia 50%
– Criação de “overload” num corredor lateral, ou seja, juntar lateral, um dos médios centro descair para esse corredor juntamente com lateral e extremo. 4 jogadores entre half space e corredor lateral.
Utilizando muito “passe e vai” e consequente realização de cortinas, estes comportamentos promovem rotações complicadas de defender. O ala do Aston Villa na linha de 5 ficou fixado no jogador à largura e a bola entrou entre si e o médio no espaço das suas costas.
Em alternativa, à esquerda e com Aubameyang mais fixo entre centrais, foi Saka, ala direito, que foi ao corredor contrário promovendo a rotação a 4. Aqui foi o lateral, Nuno Tavares, que ficou enquadrado entre linhas. Também por uma vez esta solução foi testada sem sucesso, já que, a bola recuou até aos centrais e o lance perdeu-se
3 overloads – 2 com sucesso – 1 insucesso – taxa 66,6%
– Envolvimento dos médios centros em zonas adiantadas. Lokonga e Party têm importantes funções de equilíbrio na transição defensiva, uma vez que os laterais avançam muito, no entanto, o Arsenal consegue ser mais perigoso e chegar vantajosamente ao espaço entre linhas quando um destes jogadores, nos momentos certos, não se limita a ser apoio por trás à circulação no overload ou na mudança de corredor, mas faz movimento de arrastamento que leva o médio e permite à equipa aproveitar o corredor central, quer seja através de passe de fora para dentro quer seja por dar condições ao colega ter para conduzir a bola em direcção ao corredor central, ou eles próprios conduzirem a bola no meio após ultrapassarem um adversário directo do meio-campo.
2 situações = 2 sucesso – 100% eficácia
Quando existiu insucesso
– Acção de Nuno Tavares. O lateral foi o principal responsável por aproveitar as vantagens conseguidas no corredor no 2×1, no entanto, não foi capaz. Forçou remate quando existiam soluções melhores, e os cruzamentos realizados não foram precisos. Dos 8 ataques que chegaram ao último terço em ataque posicional, sem sucesso nesta métrica, em 3 o lateral perdeu a bola.
3 situações = 3 insucessos 100%
– Forçar jogo à direita Saka e Tommyiaso e Lacazette forçaram, uma vez cada, progressão à direita (tentando cruzamento ou 1×1 e 1×2) sem grande probabilidade de sucesso. Estas situações têm em comum o facto de o Arsenal, no último terço, não ter mudado o corredor, ou seja, o Aston Villa estava confortavelmente instalado e limitou-se a esperar pelo momento certo para roubar a bola. 3 situações – 3 insucesso
Implicações para a prática
Olhando ao modelo de jogo do Arsenal, que estrategicamente poderá repetir as mesmas dinâmicas contra um adversário em 5x3x2, deixo algumas sugestões, tendo em conta os comportamentos que aconteceram:
– Ter paciência com bola, o Arsenal enquadrou mais facilmente jogadores entre linhas em algumas posses longas no último terço. Aqui duas rotas a explorar especialmente: bola quando chega ao último terço rodar pelos médios centro para o lado contrário e tentar o 2×1, ou voltar atrás aos centrais para atraírem a linha de avançados e médios. Uma vez que, existem, neste momento, vários movimentos de arrastamento sem bola, um extremo ou médio pode aproveitar a distância entre linha defensiva e média para receber e progredir
– A criação de superioridade num corredor lateral/half space com mais frequência. O Arsenal é forte na mobilidade neste espaço, há movimentos de aproximação e afastamento e capacidade para colocar passe entre linhas por parte dos médios centro (quem mais tem a responsabilidade de o fazer)
– Os movimentos de arrastamento dos médios centro de dentro para fora devem ser feitos com mais frequência. Tendo o Arsenal dois apoios frontais (Auba e Lacazette) e Smith Rowe com capacidade de conduzir de fora para dentro, é uma possibilidade que ajuda na progressão.
– Repensar a responsabilidade de Nuno Tavares. A distribuição e dinâmica do Arsenal estava pensada para aproveitar a vantagem que o lateral deveria conferir. Tomou más decisões com bola, não foi preciso nos cruzamentos e parte da superioridade da equipa perdeu-se nas suas acções no último terço.
6 decisões com linha defensiva pela frente – 1 sucesso – 5 insucesso – Taxa 16, 67%
– Não é fácil manter a consistência ao longo de 45 minutos mas à direita o Arsenal perdeu 3 bolas por precipitação quando forçou progressão pelo corredor direito e com jogadores diferentes.
– Dos 6 cruzamentos efectuados no último terço, 2 tiveram sucesso e foram únicos que envolveram um jogador enquadrado com a linha defensiva. Sem surpresa, quanto melhor trabalhada é a posse, mais hipóteses de sucesso tem o cruzamento
Possibilidade de aumento da variabilidade do modelo de jogo
Além dos aspectos mencionados é possível verificar o seguinte: o Arsenal realizou 6 cruzamentos tendo em conta esta métrica. 2 acabaram em colegas dentro da área.
Por outro lado, talvez seja importante ressalvar um aspecto de pormenor: na criação de superioridades numéricas no corredor lateral, o portador da bola não tem o hábito de conduzir e fixar o defesa mais próximo com a intenção de o receptor do passe ter mais espaço com bola
Não obstante, gostaria de destacar um aspecto que poderá aumentar a eficácia ofensiva. Quando se tem somente uma linha de 5 pela frente e um jogo lateralizado uma boa solução poderá ser movimentos de ruptura no espaço entre central e ala e/ou no half space com a bola de fora para dentro. Existiram poucos movimentos destes e quando houve raramente foram reconhecidos pelo portador da bola. Apenas em uma ocasião Smith Rowe fez este passe para Saka mas o inglês já tinha pressão nas costas e não conseguiu enquadrar. Foram identificados 5 momentos distintos em que a bola poderia ter entrado nesse espaço ou um movimento de colega era proveitoso mas em nenhuma situação se verificou a procura desse passe
Fugindo ligeiramente da métrica proposta mas relacionada, o Arsenal pode e deve melhorar bastante a definição no espaço entre linhas. Ganhou vantagens numéricas e espaciais nesta métrica mas foi incapaz de aproveitar devidamente
Anexos video:
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